Eis-me, aqui,...quer venha, ou não!
Hoje, o dia tem-me sido mais leve. Por isso, ouço o brasileiro "Seu Jorge" - América Brasil (acho que gostarias!)
Houve, mesmo assim, um momento em que me emocionei. Um antigo colega e amigo, o Geada, foi visitar-nos à escola.
Lembro-me do dia, há uns quatro ou cinco anos, em que ele apareceu triste, magro, desesperado, com aquele olhar suplicante que tão bem aprendi (depois) a reconhecer. A filha, na altura com 30 anos, fora operada, de urgência, a um cancro e andava naquela via sacra da quimio ou radioterapia...
O tempo foi passando e a filha ia reagindo, lentamente, mas reagindo ... ao tratamento.
Entretanto, o David adoeceu e, logo, ele me telefonou...
Não atendi.
A minha forçada estabilidade aparente passava por não falar, para não chorar e o David não ver os meus olhos inchados.
Não se pode chorar, nessas ocasiões. Senão, tudo se desmorona.
Espera-se pela noite, quando os outros dormem, e tira-se, de mansinho, o coração de debaixo da pedra, onde o colocamos, ao acordar.
Mandei-lhe um sms com um beijo, apenas.
Nós, aqueles que passam por situações tão penosas e destrutivas com filhos, aprendemos a comunicar com poucas palavras.
Da última vez que nos encontrámos, a situação invertera-se. O meu filho estava a melhorar e a dele, a piorar, novamente. Aí fui eu quem lhe deu um abraço e chorámos os dois.
Hoje, soube que a filha está melhor; sofreu, é certo, mas tudo indica que superou a doença. Ficam muitas mazelas das quimioterapias e transfusões de sangue...
Mas vive, com qualidade de vida. E fiquei feliz, por ele e por ela e os filhos ainda pequenos.
Aquele pai ainda tem, no olhar, uma sombra ... mas já sorri!
Foi ele que me abraçou.
Sabe!
Máquina do tempo
Devia haver uma máquina do tempo!
Não para viajar ao passado
E refazer algo
Que nos tenha desagradado.
Melhor é viajar para o futuro!
Se as coisas não se resolvem
Passamos por cima delas
No escuro.
Pior... é chegar lá e não ver,
Não encontrar vestígios de solução,
Nem pistas para trazer de volta
Que nos ajudem a saber o que fazer...
David Sobral
11 comentários:
Isabel
As suas palavras comovem-me, leio-a com os olhos sempre húmidos. Também sou mãe. Sem conseguir imaginar a intensidade da sua dor, mas sabendo ser enorme, desejo-lhe tudo de bom. Ele lá em cima, estará a rezar por si e, penso que gostaria de a ver animada com certeza. Hoje deve estar feliz por si.
A minha filha, no dia da mãe escreveu-me um poema, vou deixar aqui uma quadra:
.../...
"E porque te ofendo
Mas não permito que chores
Sofres em silêncio
Para que ninguém incomodes"
.../...
Só tem 14 anos, mas é dona de uma sensibilidade enorme...
Um beijinho para si.
Elisabete
MELHOR
Pior do que melhor
É não saber o que dizer
Não encontrar solução
Vestígios do que escrever
É não ter o tempo à mão
Com que dizer o saber
É no escuro não ter pão
Não ter força nem o querer
É não ter deixado rastro
Com que se saiba viver
-.-
Melhor do que pior
É ter memórias de encher
O que do breu de um saguão
Tenha forças no seu ser
Tenha um grande coração
Tenha o que importa sofrer
Para nos dar o que não
Se pode guardar sem o crer
Que se ergue neste lastro
Pois que voa em teu sofrer
-.-
Pior só pode ser melhor
-.-
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 9 de Julho de 2008
Às vezes venho aqui e não comento.Creio que Todos somos irmãos de alma e não fico insensivel ao sofrimento alheio.A sua Dor de Mãe,Isabel,tocou-me profundamente e agora sensibilizou-me imenso a Grandeza deste seu texto,sobre a filha do seu amigo Geada,que,por permanecer fisicamente viva,faz sorrir o seu pai.A vida seria completamente absurda se não houvesse Algo de Transcendente para além da precariedade material da Existência.Que o Deus em que acredito,mas que,tantas vezes,não sinto,nem vejo,nem entendo,pacifique a sua Dor e a faça ver mais Além,onde o seu filho David está vivo e omnipresente.António
Ao colo
Nos braços da Mãe viva, repousa o Filho para sempre adormecido. Filho lindo, bom, talentoso e sábio. Nome de Rei coração de Príncipe!
Nos braços da Mãe para sempre adormecida, não repousa o filho vivo. Filho feio, mau, egoísta e ignorante. De nome e coração de Pedra!
Estas mulheres não se conheceram, nunca se encontraram e habitam agora mundos diferentes. Mas partilham o mesmo nome, Isabel, e amigos comuns.
Em homenagem a estas duas Mães...
Estoril, 9 de Julho de 2008
MB
Isabel:
Confesso que, apesar de ter filhos e de já ter passado por uma situação muito complicada com um deles, não consigo imaginar a sua Dor.
Deve seguramente ser uma das piores provações que a Vida pode pôr perante uma Mãe ou um Pai.
Quero muito simplesmente dizer-lhe que li hoje o seu blog e que senti o David presente, intensamente presente. Ainda que o David tenha atravessado esta vida como um cometa, deixou, pelo que vi, marcas bem fortes nas pessoas que tiveram a sorte de se cruzar com ele.
Às vezes é esse o sentido profundo e importante de quem passa por esta Vida fugaz mas intensamente. Gosto de pensar que o David está agora a preparar nova etapa do seu caminho para a pureza e para a perfeição, e que sempre estará a Olhar por quem lhe deu Amor.
Aceite, Isabel, um abraço apertado e solidário de quem nisso acredita,
Salvador
"Elisabete disse...
Vim agora do blog da Pala Padinha.
http://paulapadinha.spaces.live.com/blog/
Não resisti a copiar o poema:
SER MÃE
SER MÃE É....
AMAR INCONDICIONALMENTE...
LUTAR COM TODAS AS FORÇAS
MESMO SEM CERTEZAS....
SER MÃE É...
NÃO DESISTIR....
É TENTAR ABRIR TODAS AS PORTAS
MESMO QUANDO NÃO SE TEM A CHAVE...
É AGUENTAR O MAIOR PESADELO
E CONSEGUIR SORRIR...
SER MÃE É
SER PALÁCIO DE ENCANTAR
ONDE A PRINCESA SE PODE VIR
ACONCHEGAR E SONHAR
Sem lhe retirar a autoria, a Paula vai permitir que eu o dedique a ela , à Raquel, à Isabel Venâncio e a todas as mães que sorriem mesmo quando o coração chora.
Um abraço.
.....
in
salvadorvazdasilva.blogspot.com
"Cris disse ...
A "casa da venância" despertou-me todos os sentidos desde a primeira vez em que a visitei - li, reli e concluo que além de muita dor, sente-se o cheiro do AMOR na sua verdadeira essência....
Com carinho
CrisArriaga
9 de Julho de 2008 12:52"
in
salvadorvazdasilva.blogspot.com
Isabel,
Que texto tão cheio de vida nos deixou aqui...!
Emocionei-me:
"Espera-se pela noite, quando os outros dormem, e tira-se, de mansinho, o coração de debaixo da pedra, onde o colocamos, ao acordar."
Só as mães sabem fazer isso...
Que mãe excepcional foi a Isabel!
Só hoje liguei algumas datas: 18 de Outubro de 2007. Ontem contava-lhe dos dias que passei no HGSA em Março e Abril de 2007. Será que nos cruzamos por lá, pelos corredores? Quem sabe! Pouco depois de 18 de Outubro começava o blog de Salvador Vaz da Silva que acabou por nos conduzir até aqui...
Acabei este texto pensando que na sua dor acaba por ser uma mulher forte, quanta generosidade para com o seu amigo e a filha que superou a doença!
Deixo-lhe mil beijinhos.
Branca
Bom dia Isabel!
Voltei...gosto de aqui estar. Ontem dei a ler um pouco do seu blog à minha menina (Raquel) e ela com os olhas rasos de lágrimas disse: "mamã, somos tão felizes!... não sei como é que algumas pessoas são tão revoltadas com a vida, quando têm tudo para serem felizes."
Também eu passei por uma situação complicada.
Em Maio de 2007, foi-me detectado cancro da mama. Fiz Cirurgia para extrair o tumor, fiz quimioterapia e radioterapia.
Continuo atenta, sei que não posso respirar de alívio, mas tenho fé e acredito!
Para si, mãe de coração apertado pela dor, deixo aqui uma Oração ( deixei agora no blog do Salvador):
"Deus, dai-me a serenidade para aceitar as coisas que eu não posso mudar, coragem para mudar as coisas que eu possa, e sabedoria para que eu saiba a diferença… vivendo um dia a cada vez, aproveitando um momento de cada vez; aceitando as dificuldades como um caminho para a paz; indagando, como fez Jesus, a este mundo pecador, não como eu teria feito; aceitando que o Senhor tornaria tudo correcto se eu me submetesse à sua vontade para que eu seja razoavelmente feliz nesta vida e extremamente feliz com o Senhor para sempre no futuro. Amém."
Fique bem.
Elisabete
Olá Isabel!
Peço desculpa, mas o comentário que retirou do blog do Salvador, com o poema "ser mãe", não fui eu que o deixei, mas sim a nossa amiga Graça Lopes.
Um beijo doce, de mãe para mãe.
Fique bem
Até breve
Eu andarei por aqui...
Elisabete
Não se fica indiferente ao que se lê.
É impossível deixar de (con)viver com essa realidade.
Isabel, eu que não costumo ter qualquer dificuldade em escrever, chego aqui e fico hirto.
Como se o meu cérebro parasse.
O que dizer? Como?
O que você nos traz é tão forte, tão real, que me reduz a uma quase insignificância.
Um abraço grande.
Enviar um comentário