31 julho 2008




Aqui.
O Vazio que me envolve não tem consolação.
A Dor invisível, que arrasto comigo, tem um longo som pungente de clarinete a solo.
O Olhar com que me olhas não basta para serenar este coração que não se rende.
A Saudade está debruçada no meu ombro; afago-a de vez em quando para que se mantenha mansa.
Os Dias sempre iguais, sempre iguais,...
E eu, aqui, vou-me despedindo, novamente,... nada será igual, quando voltar.
E eu, aqui, procuro os registos da memória desse tempo de alvoroço verde e olhos, ainda, brilhantes.
E eu, aqui, ouço as músicas escolhidas para te acompanharem durante a longa ausência que nos espera.
"Lembra-me um sonho lindo, quase acabado; ... estoira no peito um grito à desfilada..."
Voltaremos inesperadamente, eu sei, e será já como se a ausência se prolongasse longamente, por essa porta entreaberta que já não se fecha.
E nos aguarda.

Amanhã, vou partir. Moledo aguarda-nos; levamos as mãos vazias e as malas plenas de desilusão só porque, em tempos, nos atrevemos a ter ilusões.
E eu, aqui, sei que repetiria tudo o que teve que ser.
Não apagaria um único traço do trajecto percorrido.
Voltaria a atrever-me.
Voltaria a não me render.
Porque é a única forma de viver.



Sinto uma aridez que me toma
Sempre que tomo a caneta na mão
Trágica e final é como ela se faz constar.
É por quem se toma!

E, assim, no dia em que tudo se for
Parte com a dor
Que existe
Entre a esperança e o amor.

Porque há tanto e tão pouco
Que me deixa quase louco...

David Sobral

7 comentários:

Anónimo disse...

É bom poder dizer que se fez o melhor que, afinal, se conseguiu fazer.
E ter, apesar da derrota, essa certeza.
Perdi um filho adolescente e não consigo deixar de pensar que não reparei, que podia ter conversado mais com ele, que podia tê-lo ouvido mais, que podia ter evitado que ele se lançasse no abismo.
É bom ler os seus textos. Não estou só na minha tristeza. Sabe dizer as coisas que eu sinto.
É como se um laço nos unisse, de Gaia a Leiria.
Obrigada por partilhar o seu sentir de mãe que perdeu um filho.
Às vezes, os outros não nos compreendem.
Não imaginam...
Obridada
Eunice

Anónimo disse...

Olhe, querida Isabel

Nutro por si uma enorme simpatia e afecto, mesmo sem a conhecer.
É a doçura das suas palavras que me traz, aqui, regularmente.
O seu blog não podia deixar de ser triste, mas é tão bonito.
E admiro a sua forma discreta de não referir outras pessoas, talvez pouco presentes, na vida do seu "rapazinho", como, às vezes, lhe chama.
Porque os nossos filhos são sempre os nossos rapazinhos...
Um abraço solidário.
M.L.

Anónimo disse...

DESPEDIDA

Parte a aridez
No que tomas e não vês
Por quem se toma afinal
Por trágica e bestial
-.-
Parte com a dor
Deixa a esperança e o amor
Sempre que tomo a caneta
Brilha a cauda do cometa
-.-
Já sem dor com muito ardor
Fica tudo o que a compôr
Vos deixo cheio de sal
Os meus poemas de cal
-.-
Deixo tudo em que crês
Somado à minha vareta
-.-
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 31 de Julho de 2008

Anónimo disse...

Partes para Moledo ,no mês de Agosto, sem o David, embora ele por lá ande em casa, nos montes, na praia e nas luzes do entardecer.

Regressarás a casa, quando o teu filho mais velho te chamar interrompendo as férias de Agosto, e aí talvez os dias comecem, lentamente, a não ser tão iguais, pese embora o vazio não seja nunca mais preenchido.

O David faz parte de Nós...será impossível que ele não continue colado à nossa pele.

Mas no mês de Agosto Alguém entrará pela porta entreaberta e vamos atrever-nos mais uma vez a ter ilusões!

Beijinhos.
Nini

Anónimo disse...

Princípio de Verão

Largos longos doces horizontes
A desdobrada luz ao fim da tarde
Um ar de praia nas ruas da cidade
Secreto sabor a rosa e nardo arde

Sophia de Mello Breyner Anderson
Obra Poética - Ilhas

A pensar na tua casa de Moledo.
1 beijo.
Nini

Anónimo disse...

Esta "Casa da Venância" pode ficar,na história da blogosfera,como um blogue de profunda amargura e tristeza,tão humanamente compreensivel e pungente,ou transmutar-se historicamente num clamor esperançoso para todos quantos vivem e sofrem as mesmas amarguras.A diferença residirá,a meu ver,na Rendição à Morte ou no desvendar da Luz que reside para Além da Dor...António

Anónimo disse...

Meu Caro António,

Nem mais!

-.-

PARA ALÉM

Para além da tua dor
Há sempre outro bojador
Há uma dobra que me impuz
Há mais calor há mais luz
Verga-se ao teu clamor
Rendida a morte sem cor
-.-
Fica a esperança e o amor
Ergue-se a voz do turpor
Transmuta-se a amargura
Dos que sofrem a tortura
Enche-se toda esta esfera
Da vontade que impera
-.-
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 1 de Agosto de 2008