09 dezembro 2008

Estranho!


Amores-perfeitos de Lamego


Mesmo escurecendo cedo, são tão longos os dias.
É tão cansativa esta árdua tarefa de fugir de mim própria.
Ou da outra que, em mim, acorda quando a noite cerra as portas do esquecimento e do sonho.
Acordo com uma espécie de estranhamento perante tudo o que me rodeia.
Surge sempre a dúvida (que não o é...). Como cheguei aqui, assim?
E regresso a um quarto de paredes claras, iluminadas pelo sol filtrado por persianas semi-corridas.
E vejo-me ali, quieta, à entrada do quarto, vendo-nos.
Nós, lá dentro, numa espécie de tempo ausente, expectante e transparente.
Somos só nós, envoltos numa auréola de já não existência indolor.
Não vemos o que nos cerca.
Existimos apenas, ali, por mais algum tempo.
Um para o outro. Fora de tudo e de todos.
A que permanece à porta sabe que, ali dentro se espera o momento da partida. Uma parte de si vai também; nunca te poderia abandonar. Não, agora!

Mas reparo, também, na outra; a que está encostada na ombreira da porta, atenta, vigilante e contida na sua missão.
Está sempre pronta a entrar e a proteger-te.
Precisa de se distanciar para não ficar paralizada pela dor daquela que, lá dentro, te segura mão.

São duas, ali, naquele quarto - a que sofre uma dor sem nome e a outra que se protege daquela dor porque tem que ser forte e corajosa.

Este estranhamento, vou-o sentindo, mais e mais, agora.
Sou uma terceira que, ainda, não se encontrou.
Procuro.
Procuro-nos, ainda, nestes amores-perfeitos que falam de ti.
Procuro-me, nos olhos grandes e escuros do meu neto que me olham longamente, sem desviar o olhar.
E me sorriem.
Não há sombras tristes do passado, nesse olhar.
Gosta de mim, assim ...
Como se o tempo estivesse a começar, agora.
Estranho!


2 comentários:

Anónimo disse...

AMOR PERFEITO


Perfeito é o amor

Que se aconchega no leito


Que no meio do seu canteiro

Nos atrai com seu odor


Que se põe ao parapeito

A mostrar a sua cor


Que sorri como o carteiro

Trazendo cartas de amor


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 10 de Dezembro de 2008

Branca disse...

São lindos os amores perfeitos de Lamego!
Gostei tanto deles!
Beijinhos