Fala-se de dias e dias que escorrem ... sem um filho que partiu! Fala-se à toa ... e escreve-se, sempre, para silenciar a saudade ou as lágrimas. À toa ...
17 março 2008
As minhas insónias...
Acordei sobressaltada.
De repente, pouco depois de ter, talvez, adormecido.
Regressei ao dia 13 de Outubro de 2007. É uma da tarde! Estou na urgência do Hospita de Santo António. Já não tem segredos para mim.
Mas esta ida à urgência é diferente, porque sei o que se vai passar. E eu transpiro e tenho o coração acelerado.
Entrarei, irei ter com o David que me espera no corredor... sorrirei sempre, como doutras vezes. Brincaremos com algumas "cenas engraçadas" a que já nos habituámos.
Só que, desta vez, não sairemos os dois.
Sairei só eu, seis dias mais tarde, pela porta principal, pela mão do Sérgio e do Manel.
Envolta num despertar estranho, estará sol e verei o David, mais tarde...deitado numa "chapa" metálica, onde me parece desabrigado. Na viagem que encetou, não vai dar-me a mão para me dar coragem.
Mas está bonito. E só penso num barquinho que levam as cinzas para o mar de Moledo.
Era o refúgio dele
Fico ali enquanto posso e regresso a casa. Alguém me empurra. É a primeira noite que vai passar sozinho e não haverá abraço de despedida.
Nem mão como aconchego...E eu gosto da mão dele, meiga, suave e grande, quando a esbatia sobre a minha.
E regresso. Alguém me empurra para longe dum filho doce... O tempo foi tão curto!
Mãe do David "O BOM"
Ode do Desesperado
(Egipo)
A morte está agora diante de mim
como a saúde diante de um inválido,
como abandonar um quarto após a doença.
A morte está agora diante de mim
como o odor da mirra
como sentar-se sob uma tenda num dia chuvoso.
A morte está agora diante de mim
como o perfume do lótus,
como sentar-se à beira da embriaguês.
A morte está agora diante de mim
como o fim da chuva,
como o regresso de um homem
que um dia partiu para além-mar.
A morte está agora diante de mim
como o instante em que o céu se torna puro
como o desejo de um homem de rever a pátria
depois de longos, longos anos de cativeiro.
Versão de Helberto Helder
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1 comentário:
Deixei-me cair no chão do corredor frio do Hospital quando a Diana saiu do quarto do David sem perceber bem porque a estavam a empurrar com força para fora. Lá dentro tu e o Manel sozinhos tentavam agarrar ainda a vida do David que já tinha adormecido.
Depois foi o vazio e o desespero. Lembro-me de em passo apressado ter de ir procurar a funerária mais próxima e de correr através de corredores compridos.
Lembro-me de me cruzar com o Sérgio e com a Carla e não esquecerei os olhares perdidos , todos a correr mas em sentidos contrários, na busca do David que nos tinha deixado.
Eu queria estar convosco, sentir ainda o calor do David, mas havia coisas a tratar e por isso fui.. sempre a correr.
A Olga foi comigo a casa e pedi-lhe que escolhesse a roupa que o David gostava de usar:"..não te esqueças de trazer uma t-shirt preta para vestir por dentro da camisa como ele gostava-disse-lhe".
Tratei de tudo,acho eu, e corri muito nesse dia ,para chegar antes de fecharem as portas,antes das 18h, não do quarto, mas daquela sala fria onde o David lindo e sereno, vestido com a roupa que escolhemos,parecia dormir.Ainda consegui abraça-lo e dizer-lhe quanto o adoro, mas foi com uma enorme raiva que olhei em volta e vi que não tinha ficado com ele, com o Sérgio, contigo e com o Manel ... porque havia coisas a tratar. Abraçá-lo e encostar-me a ele foi o bocadinho que trouxe comigo e que guardo cm todas as fantásticas recordações do meu sobrinho maravilhoso.
Afinal parece que "..correu tudo lindamente..".
Nunca falei de nada ... apenas hoje escrevi mas nunca esquecerei.
Beijinhos. Nini.
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