04 março 2009



Não sou daqui, nem de nenhum outro tempo exacto.
Aliás...
Hoje, não me sinto eu.
Amanheci assim, numa ausência sonâmbula.
Não sei, no entanto, quem é esta que sinto, dentro de mim.
Incompleta e solitária.
Tolhida da saudade sempre igual...
E solitária, apesar da tanta gente que me envolve de carinho, de atenção, de paciência.
É qualquer coisa de interno.
Vertiginoso e inesperado, apesar de sempre latente.
Vem de dentro das próprias entranhas mais profundas e nada depende de mim.
Vai subindo, subindo até não ser possível não sentir este ferrão na carne; este enjoo só de respirar; esta raiva de ver o Sol (mesmo encoberto) nascer, pontualmente...
É que tudo está errado.
Tudo está no seu lugar.
Menos a minha existência, aqui, que te aguarda, por vezes e ainda, "no limiar de uma súbita ausência..."
E obrigo-me a tactear, neste limiar sombrio e silencioso, e a segurar-me sem força, a uma corda frágil.
Hoje, não me sinto eu.
Quero silêncio, apenas.
Talvez, fechando os olhos, te possa ver.
Talvez, tapando os ouvidos, te possa ouvir.




Isola a minha vida.
Isola-a com camadas
de neblina
densa,
no sopé da colina
da saudade.

Princesa Shíkishi
(1153-1201)

4 comentários:

Anónimo disse...

Silenciem o ruído incómodo das gruas
Façam calar o girar da Terra em sua órbita
Emudeçam as aves e os poetas
E o agitar suave das papoilas
Porque até isso dói e me desperta

Manuela Baptista
Estoril, 4 de Março de 2009

Anónimo disse...

SIMETRIA DE PRINCIPESCO POEMA


Saudade
colina no sopé
densa
neblina
com camadas a isola

Vida minha a isola


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 4 de Março de 2009

Anónimo disse...

Na verdade, não temos saudades, é a saudade que nos tem, que faz de nós o seu objecto. Imersos nela, tornamo-nos outros. Todo o nosso ser ancorado no presente fica, de súbito, ausente.
(Mitologia da Saudade)
Eduardo Lourenço
Um beijinho, que gostaria de aliviar a sua dor,
MM

Branca disse...

Querida Isabel,

Tenho passado, embora algo silenciosa, silenciosa também em algumas saudades menores, mas saudades, que não quero somar às suas, já lhe chegam as que tem, que adivinho serem pesadas.
No entanto há uma vida cá fora, pelo amanhecer...
Beijinho enorme.
Branca