Mais um Dezembro que se alonga
No calendário
é
mais longa
de casca de laranja
muitas luzes
vozes que se atropelam
entre tilintar de brindes
...
um silêncio saudoso
pelos nomes dos lugares
que foram ficando
vazios
...
histórias de outras noites jovens
de Natal
numa aldeia beirã
tantas mesas
tantas vozes
tantos sonhos
no sapatinho da menina
a luz de uma candeia
que guia o regresso
a casa
na escuridão da noite
cortada pelos risos
muitas vozes
há quem cante
há muito
muito tempo
...
não agora
agora é preciso
que tempo avance
que avance
de olhos vendados
sem olhar para trás
sem o aroma da canela
sem o tinir dos pratos
sem o cheiro da casca da laranja
sem o tilintar dos brindes
...
agora
já sinto o vazio
do teu lugar à mesa.
O sonho dos outros
Cecília Meireles
É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome,
o som da nossa voz,
o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer
é o dia carregado de actos,
a ideia de recompensa e de glória.
O que é preciso
é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence.
1 comentário:
Nada nos pertence, apenas os afectos e o belo que a vida e a natureza nos dá. No entanto tudo nos fica, tudo é memória e a memória às vezes é doce e terna.
Beijinhos
Branca
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