14 novembro 2010

Faz, muda, altera, não faças ...

Moledo,
Gaia,
Moledo,
uns cravos vermelhos na areia,

Paris, a luz da cidade, a cidade LUZ, as comidas preferidas do David,
numa loja "do David", brinquedos para o Miguel,
passeios de city tours, muitas dores nos pés, mais locais de Paris,
uma boutique Nytia,
algumas lágrimas e a saudade,
um museu líndíssimo,
não tanto pelo que alberga,
mais pela arquitectura, mais pelos jardins suspensos, Branly,
perto da torre Eiffel,
os cartazes a anunciar espectáculos, muitos espectáculos,
muitos desenhos de luz,
sem a luz de palco, o palco na penumbra,
eu na penumbra, sempre,
apesar da luz brilhante do sol, que me aquece.
E que me agrada! 
... mas preciso de chorar.


Faz um esforço mais,
é preciso ter outra atitude,
pensa nos outros,
ainda tens tanto para viver,
não podes continuar assim,
precisam de ti,
o David não volta,
constrói projectos,
és tão nova,
volta à escola,
não podes continuar assim!

Assim como?
Isto que faço não se chama viver? 


Então e Moledo e o livro terminado e o jardim 
e as ervas daninhas que arranco, debruçada sobre a terra, durante horas.

E a chegada do Miguel, logo pela manhã, que, 
com um belo sorriso de quem acabou de acordar, 
avança intrépido para as três gatas que o aguardam no hall, 
ali atraídas pelo toque longo da campainha.
E avança, 
"GATATATA ..."
 fazendo girar a sua própria gata de peluche, na direcção dos "pobres" animais, 
sempre curiosos deste ritual.
Subitamente, num momento de ternura, o Miguel pára;
 sorri, abraça a sua Becas, 
dá-lhe dois beijos no focinho e ... 
de novo, lá vai ele na direcção da Genufa que, curiosa, ainda resiste, 
atrás da cortina. 
Mas não tarda a fugir, impelida pelo “Gatatatatata ...” vigoroso 
ou por algum bocado de plasticina que esteja à mão. 
E o Miguel dá gargalhadas sonoras, 
mais ou menos indiferente aos pedidos de beijos da avó ou da Tata 
ou às tentativas de despedida da mãe ou do pai.
Que aguardam que o Miguel termine a sua entrada sempre tão calorosa e viva.
...
E Moledo, Gaia, Caldas de Aregos para almoçar com amigos 
e Chipre, ainda a acompanhar o Manel!
Chipre,
o mar azul e quente, sobretudo o mar azul e quente,
azul
e a lonjura
e as saudades ...
dos telefonemas aos filhos
...
do tempo em que havia David,
do David.

Faz um esforço, por quem precisa de ti.
Tens de viver!
E quem diz que não faço?
E tudo o que faço ... não se chama viver?
Ou tentar?
Muito esforço ... talvez não se veja!
Maldito cansaço!
Só o Miguel o espanta!
Quem sabe do esforço que faço?


Anda!
Fá-lo por ti!
E o tricot?
Tens-te esquecido do tricot!
Faz um esforço por ti.

Por mim? Quem diz que preciso de mim?
Confunde-se, talvez, com o que faço pelos outros!

Vai ao ginásio
Inscreve-te na natação
Faz ioga
Vai ao cinema
Faz um curso de culinária, gostas tanto de cozinhar
Não te enfies em casa
Descansa
Vai à escola
Dá uns passeios à beira-mar.


Sinto-me cansada!
Hei-de voltar à Junta Médica
(um pequeno problema oncológico)
Mas estou bem.
Tristeza? 
É normal!
....
E o esforço que eu podia pedir que fizessem por mim?
Mas não peço!
Bastaria que não ligassem quando me vêem com uma lágrima.
Nem sempre lhes resisto! 
Durante o dia ...
Mas esforço-me.
Bastaria uma festa silenciosa na cabeça,
 ou apenas aquele "Está bem, só um bocadinho, para aliviar!" 
que o Manel murmura.

...
Por que razão preciso tanto de chorar?
Talvez porque não chorei antes ...  não podia.
Agora, choro muito ... porque sim.
Há momentos em preciso de respirar, 
como se tivesse a respiração aprisionada,
há muito tempo.
Preciso de respirar fundo.
Encher os pulmões do ar que me rodeia.
E que me faz chorar.
Porque não sinto o cheiro do David.

3 comentários:

Ana Cristina disse...

Um beijinho para ti.
Nini

Branca disse...

E como a compreendo Isabel, pois chore sim, faça tudo o que lhe apetecer, hoje é também um dia muito especial, a notícia que recebi até para mim foi gratificante,é um projecto cumprido e sei que também a vai fazer chorar, que é uma emoção para si, mas chorar às vezes faz bem, nunca se deixa de chorar por um filho e isso não significa deixar de viver, eu sei.

Até breve Isabel, lá estarei.
Beijinhos
Branca

Anónimo disse...

Isabel, gosto tanto desta sua/nossa nova casa! tão bonita, tão cheia de força!Porque a Isabel é forte, embora se calhar não o consiga ver. E essa força é que a faz andar para a frente, quando só lhe apetece deitar-se e dormir! O David mereceu-a, o Miguel merece-a também. Gostei muito de a ver. Nessa fotografia está espelhada a sua alma, e ela é linda, linda. Um beijinho no coração,
MM