Hoje. Agora. Há 36 anos. Não dormia. A nossa mala preparada junto à janela. O filho Sérgio, com quase dois anos, adormecido ali ao lado. No meio do silêncio, eu esperava a madrugada. Uma criança estava prestes a chegar. Amanhã, a 27 de Abril.
Não estava assustada. Um pouco nervosa, talvez. Tinha 22 anos e sonhos por realizar. A criança a chegar era bem-vinda. Tão desejada! Menino? Menina? Não importava. A cor da roupa de bebé era indiferente. Era da cor do arco-íris.
Eu tinha 22 anos. Já com um filho. Era uma mãe muito jovem. Era uma menina crescida já muito ciosa do seu papel de mãe. Era, afinal, o que sempre quisera ser - Mãe. Uma mulher menina muito mãe. Fora assim que me vira, desde sempre. Desde adolescente, menina namoradeira, menina maria rapaz. Mas um dia ... seria mãe.
E então vieste ... menino. Outro rapazinho! Eu encantada! E mais uma noite, sem dormir. Porque a passei a olhar para ti. Num quarto, eu e tu, no segundo piso da Trindade.
(Que bom ter fixado essa imagem. De forma tão nítida, ainda hoje.)
(Mamã, e eu? Também foi uma cegonha que me trouxe? / Não, David, tu vieste nas asas das andorinhas de Abril.
E foi sozinha, durante o silêncio da noite, que escolhi o teu nome. E ia chamando por ti. David! David! Repetia e olhava para ti. Sim. David, ficava-te bem. É um nome doce. Sérgio e David combinavam bem, na minha cabeça de mãe, muito mãe dos seus meninos.
Estava definitivamente apaixonada por ti, David! Sempre estive. Ainda estou! O meu amor por ti aumentará. Visceral como o tempo. Um amor incondicional, como sempre foi. Partilhado, afinal. E tu sabias. Soubeste sempre. Do meu amor por ti, dos meus sonhos, do meu sentir de mãe já não menina.
Agora ... que fazer deste amor incontornável, ferido de lonjura, mágoa e solidão, com intenso sabor a sal ...
Sal do mar, onde, sem saber como ali chegara, te deixei?
Até amanhã, David.
1 comentário:
Um terno e doce beijo!
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