De novo.
À roda dos papéis, dos dossiers, dos livros, das folhas soltas do David.
Um pouquinho mais a sensação de vazio e lá vou eu folhear tudo o que tem aquela letra esquerdina, um pouco torta, tão minha bem conhecida.
Tivera eu mais tempo para mergulhar nos papéis do meu filho!
São textos dos programas de Jazz Fazz Tarde, são críticas de análise teatral que escrevia para as aulas da Prof. Isabel Alves Costa, são crónicas do quotidiano da rua, dos shoppings, tudo o que via à volta.
(Era um rapazinho espantosamente observador; tudo relatava depois de filtrado por um sentido de humor muito seu, muito único, muito próprio.)
E chego sempre à mesma triste, dolorosa sensação de perda irreversível.
O meu filho é uma contínua caixinha de surpresas.
Agora, ao rever os textos dele do programa de Jazz ... descubro que o reverso da folha de cada novo programa tem "críticas" de espectáculos de teatro que ele ia ver e que tinha de analisar, no âmbito dos estudos que fazia na ESMAE (Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo).
Escrevia no verso da folha ... para poupar papel ... lembro-me agora ...
São antigos, claro ... Tão distantes!
Tão de quem está de bem com o que faz.
Deparei com este e cheguei a sorrir, David.
Há bocadinho, passada esta eternidade.
Análise Teatral - Sexo, drogas e rock & roll
Depois de sair de casa à pressa, meti-me na VCI para ir, primeiro, buscar um amigo. Debaixo de chuva intensa, dou de caras com uma fila de carros enorme. Já estava atrasado. Eram os domingueiros, em fila de espera, para entrarem no parque de estacionamento do Arrábida Shopping.
No meio de tamanha confusão, fiquei tão irritado que proferi mais palavrões e insultos só ali, do que no resto da minha vida como condutor.
Terminado o meu monólogo ao volante e, já depois de ter ido buscar o meu amigo,chegámos ao teatro em cima da hora. Uma grande azáfama, pensei logo "Não há bilhetes!!"
Não fosse eu ter de interpretar mais uma vez o meu monólogo (desta vez, já com público), conseguimos sem problemas, os tão ansiados bilhetes.
Entre entra e sentar, não deixei de reparar no público que me rodeava - meninas, mulheres ... e mulheres mais velhas. Umas em grupos assumidamente femininos, outras com os seus respectivos ...
Reparei também nos temas que ali se discutiam e que roçavam assuntos bem opostos - ou o novo não-filme "Branca de Neve" ou o concurso "Big Brother".
Com o começar da peça, silêncio se fez, mas de imediato se quebrou com a música e com a voz do actor. O som estava muito alto e feria-me os ouvidos. Só desejava que a música acabasse rapidamente. Depois deste momento forte, Diogo Infante veste a pele de vários personagens tipo da sociedade moderna.
Os riso do público, ou deverei talvez escrever, pública, foram constantes, quer fosse devido ao texto, quer fosse devido às expressões faciais e corporais do actor. Alguns personagens são bem fieis à realidade.
Pensei até na minha figura de condutor ríspido e ordinário como possível personagem a figurar nesta peça.
Outros personagens tornam-se, após alguns minutos, numa "seca". Para usar uma expressão apropriada. As suas semelhanças com outros fá-los parecer não mais um, mas sim uma extensão de outro personagem.
Os risos, esses sim, vão-me saindo, ainda que discretos. Mas nunca como os do senhor, na cadeira ao meu lado, que, enquanto ria desinibidamente, batia com a mão na sua perna ... ainda mais desinibidamente. Não fosse o Diogo Infante dizer uma piada mesmo boa, despi i meu casaco e pousei-o em cima das minhas pernas. Como prevenção!
Para terminar, acrescento que, neste espectáculo, as pessoas vêm ver o actor.
Com grande discrição, mas sem perder qualidade, o desenho de luz, a cenografia e os outros elementos cénicos não perturbam nem ofuscam a performance do actor.
Regressei, sereno como o trânsito, desta vez. David Sobral"
http://www.tnsj.pt/2001/2000/programa/sexdrogas/index.htm
1 comentário:
Muito interesasnte o texto do David, próprio de um rapaz inteligente, com sentido crítico e sempre atento ao que o rodeava.
Parabéns Isabel e beijos.
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