23 janeiro 2015

Eu não existo sem você!

Vagarosamente
A noite vai-se aconchegando ao fim.
Os sentidos, prisioneiros das horas
Deslaçam-se brandamente
E acomodo-me, finalmente, inteira
Na câmara encoberta da memória
Onde permanecemos tu e eu
Fora do tempo

Adormeço no conflito
Entre o pesar da tua ausência
E o sentir do dever cumprido
Pela metade de mim que se rendeu ao sol.

Esta que se deita inteira
Sem máscaras
E inteiramente tua
Amanhecerá amanhã
Cortada ao meio
Dividida em duas.
Até novo anoitecer.


Porque sim.
É sempre assim.







19 janeiro 2015

Aquele dia ... de todos os meses.


Porque mal o dia acorda
Pressinto-te
Naquela espécie de abandono de mim
Que, em mim, se instala.

Fixo-me no olhar com que sorris
Da fotografia do passe-partout
Cansado das viagens em que sempre me acompanhas
Estendo a mão
Passeio-a pela tua face ...
Percorro com os dedos cada contorno
Do teu rosto jovem
Que jovem eras!

O olhar retrai-se.
Imobiliza-se na brancura da parede
Em busca de uma resposta que nunca virá.





07 janeiro 2015

Não resistir como forma de resistência!

É noite.
O consciente relaxou.
O subconsciente latente (ao longo do dia), em moto continuun, materializa-se.
Enfim.
Poderoso e nítido, instala-se no acordar, à hora do adormecer..
Penetro no limbo dos olhos abertos sob as pálpebras cerradas.
A consciência é leve, bloqueia o que interessa para aligeirar a passagem das horas.

Será que isto que digo ... tem sentido?

Neste limbo nocturno, o pensar rompe as algemas, liberta-se de mim.
Instala-se possante e olha-me de frente.
Penetra até ao osso, rói as entranhas.

Então ...

Só as palavras me libertam.
Preciso de escrever.
Escrever à toa, sem olhar para trás.
Esvaziar a mente das letras soltas que vão, inevitavelmente, juntar-se.
No teu nome.



01 janeiro 2015

Recomeçar (de novo) ...







Hoje, David querido, acordei contigo, nítido e luminoso, dentro de mim.






Debruçado sobre a secretária, tiras da pasta a tiracolo a agenda Âmbar do novo ano, ainda em branco.
Ao lado, pousas a do ano anterior, desgastada pelo uso, preenchida de anotações e de desenhos de luz, de riscos e rascunhos.
A tua caneta preta de tinta permanente preferida está limpa e cheia.
O telemóvel carregado e o computador aguardam.
Atrás de ti, o enorme placard magnético suspenso na parede, completamente preenchido com a tua certificada e ímpar letra torta de esquerdino.
Será, em breve, apagado.
Mas, por alguns minutos mais, examinarás os 365 dias que passaram. Está ali a tua vida do ano que, ontem, findou.

Um swing esvoaça no ar, desde que te levantaste, sem pressas.
Reconheço, no entanto, os sinais do teu "delírio" interno, da tua inquietação criativa.
Exteriormente é um processo vagaroso, indolente, metódico e saboroso.
O teu ritual muito peculiar de preparação para mais um ano.

Depois de assinalada a primeira página, com aquela tua assinatura de letra grande, nítida, um pouco infantil e sem arabescos, preenches os dados pessoais e profissionais.
O meu nome e número de telemóvel estão lá, no contacto urgente.

Então, sistematicamente, procuras as datas de aniversário da família e dos amigos. Escreves apenas Mãe, Sérgio, Nuno Aroso, Avó, Eleonor, Manel, Carlinha ... Como consultas diariamente a agenda, nunca há o risco de te esqueceres das pessoas de quem gostas.
O dia do teu aniversário tem sempre uma anotação especial, entre o sério e o surreal!

Só então, dás início ao demorado e metódico procedimento de transferir do placard e da agenda antiga todas as informações úteis e novas que foste registando, ao longo do ano, para um novo folder no computador e para a nova agenda.

Uma interrupção para um copo de leite e umas torradas, lentas e saboreadas.

A música dos CDs criteriosamente escolhidos, cheques fnac de Natal, complementa o ambiente de assumida renovação.
A concentração é total.
Alguns projectos concretizam-se já na tua mente, enquanto folheias, lento  e longínquo, os mini-catálogos de milhentas cores de filtros de luz, a par dos desenhos dos palcos dos auditórios que vais percorrer.
A luz, a música a gestão cultural são a terra firme em que te ancoras.

A agenda velha já foi arquivada, o placard que esteve em branco por breves minutos, já começou a ser preenchido com concertos, viagens, encontros, workshops, ...

Uma pausa para descer ao terceiro andar, um beijo e uma conversa privada com a tua avó. Encostados os sofás, num sussurro assumido e vigilante.

Agora, a lassidão prazenteira com que te balanças e sorris para dentro de ti.
Finalmente estendido no sofá, um zapping pelos canais de música.
O descanso do guerreiro.

E eu, por perto e pelo cantinho do olho, sei de cor os preceitos grandes e pequenos da estranha e bela sabedoria que te embala.

·       Podemos ser distraídos na vida pessoal, mas temos que ser perfeitos na actividade profis­sional! Não há desculpa para a falta de rigor.
     Deve haver sempre música (boa, não uma música qualquer) a tocar. Podemos cantar a acompanhar.
·      Temos de estar atentos às coisas novas e ser exigente na escolha da música, filmes, espectáculos e sair de casa para os ver e ouvir.
·      Não se fala quando se vêem filmes, mesmo na televisão.
·      As luzes directas encandeiam e incomodam. Devemos usar luzes indirectas e evitar o ex­cesso de luz.
·      Não conduzir depressa e, sobretudo, não passar por cima dos buracos J
·      Nunca desistir!
·      Ter sempre projectos novos!
·      Acreditar que podemos realizar todos os sonhos, sem medo de ser considerado ingénuo ou imaturo!
·      Desejar.