30 março 2013

Não conheço outra forma ...


A propósito da minha forma
(Talvez estranha aos olhos dos outros)
De avançar nos dias
Indo uma (de mim)
A par da outra ...








"Num daqueles dias de Outono, em que nos queima a vermelha labareda das folhas, um amigo pediu que lhe contasse uma hostória. "Salva-me a vida, conta-me uma história." E eu recordei aquela mulher das Mil e uma noites, que encadeava, com doçura e desespero, uma história na outra, pois só a história infinita nos permite escapar à maldição da morte.
Um amigo é uma história que nos salva."

Mário Rui de Oliveira
O vento da noite

26 março 2013

"No sorriso louco das mães"





Escrevo, claro, para mim
Escrevo, bem o sabes, para ti
A quem trato por tu, aqui
O - tu - que só existe por dentro e por fora
Do dentro de mim
Eu e tu ...
Talvez só eu?
No dizer ...
Ou só tu?
No sentir ...
Qual de nós permanece?
E de que forma acontece?

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."
Clarice Lispector 

23 março 2013

Tic .. tac ... tic ... tac ...




Teria sido um dia como outro qualquer
De viver simplesmente
Não fora haver umas letras a negro
Premonitórias
Naquela carta fechada

Teria sido possível a vida seguir o seu curso
O seu ciclo natural de sementes que germinam
Não fora haver umas letras a negro
Naquela carta fechada

Teria sido ainda e outra vez primavera
E sempre Abril e ainda Abril
Não fora haver um destino oculto
Naquela carta fechada

Teriam sido luminosos os teus palcos
E o brilho dos teus olhos caloroso
Não fora haver um desígnio sombrio
E frio
Naquela carta fechada

Este dia de Março
hoje
seria um dia vulgar
de início de primavera
de renovar flores nos canteiros
de andorinhas empoleiradas nos postes
...
não fora aquela carta fechada
aquelas palavras obscuras
e eu num chorar de ranger dentes
solitário
dentro do carro parado
numa berma da estrada
...
e a vida a passar ao lado!

Tic ... tac ...tic ...tac ...









......

16 março 2013

Il faut savoir cacher ses larmes ...


"Isabel, que bem estás! E esse teu ar de menina, minha querida. Por ti o tempo não passa ... 57 anos e sem rugas ..."

E olho a que sobe comigo, no espelho do elevador.
Uma outra dentro de mim não reconhece o reflexo.
Sobreposição de imagens, com certeza!
Ter-nos-emos encontrado, porventura!
Algures!

Mas viro as costas ao espelho.
E então descubro!

Uma era irreal ... Efeito da luz
Coisas da Física!

Outra ... Esta é real ... Efeito da penumbra e da tristura
Coisas da imensa Saudade
Que perdura!






Il faut savoir encore sourire
Quand le meilleur s'est retiré
Et qu'il ne reste que le pire
Dans une vie bête à pleurer
Il faut savoir, coûte que coûte,
Garder toute sa dignité
Et, malgré ce qu'il nous en coûte,
S'en aller sans se retourner
Face au destin, qui nous désarme,
Et devant le bonher perdu,
Il faut savoir cacher ses larmes
Mais moi, mon coeur,je n'ai pas su
Il faut savoir quitter la table
Lorsque l'amour est desservi
Sans s'accrocher, l'air pitoyable,
Mais partir sans faire de bruit
Il faut savoir cacher sa peine
Sous le masque de tous les jours
Et retenir les cris de haine
Qui sont les derniers mots d'amour
Il faut savoir rester de glace
Et taire un coeur qui meurt déja
Il faut savoir garder la face
Mais moi je t'aime trop
Mais moi je ne peux pas
Il faut savoir
Mais moi je ne sais pas


07 março 2013

Coisas do teatro ...


De novo.
À roda dos papéis, dos dossiers, dos livros, das folhas soltas do David.
Um pouquinho mais a sensação de vazio e lá vou eu folhear tudo o que tem aquela letra esquerdina, um pouco torta, tão minha bem conhecida.
Tivera eu mais tempo para mergulhar nos papéis do meu filho!
São textos dos programas de Jazz Fazz Tarde, são críticas de análise teatral que escrevia para as aulas da Prof. Isabel Alves Costa, são crónicas do quotidiano da rua, dos shoppings, tudo o que via à volta. 
(Era um rapazinho espantosamente observador; tudo relatava depois de filtrado por um sentido de humor muito seu, muito único, muito próprio.)

E chego sempre à mesma triste, dolorosa sensação de perda irreversível.
O meu filho é uma contínua caixinha de surpresas.
Agora, ao rever os textos dele do programa de Jazz ... descubro que o reverso da folha de cada novo programa tem "críticas" de espectáculos de teatro que ele ia ver e que tinha de analisar, no âmbito dos estudos que fazia na ESMAE (Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo).
Escrevia no verso da folha ... para poupar papel ... lembro-me agora ... 
São antigos, claro ... Tão distantes!
Tão de quem está de bem com o que faz.
Deparei com este e cheguei a sorrir, David.
Há bocadinho, passada esta eternidade.


Análise Teatral - Sexo, drogas e rock & roll

"Hoje, domingo, fui à matiné do Teatro São João, assistir à peça acima anunciada com o actor Diogo Infante.
Depois de sair de casa à pressa, meti-me na VCI para ir, primeiro, buscar um amigo. Debaixo de chuva intensa, dou de caras com uma fila de carros enorme. Já estava atrasado. Eram os domingueiros, em fila de espera, para entrarem no parque de estacionamento do Arrábida Shopping.
No meio de tamanha confusão, fiquei tão irritado que proferi mais palavrões e insultos só ali, do que no resto da minha vida como condutor.
Terminado o meu monólogo ao volante e, já depois de ter ido buscar o meu amigo,chegámos ao teatro em cima da hora. Uma grande azáfama, pensei logo "Não há bilhetes!!"
Não fosse eu ter de interpretar mais uma vez o meu monólogo (desta vez, já com público), conseguimos sem problemas, os tão ansiados bilhetes.
Entre entra e sentar, não deixei de reparar no público que me rodeava - meninas, mulheres ... e mulheres mais velhas. Umas em grupos assumidamente femininos, outras com os seus respectivos ...
Reparei também nos temas que ali se discutiam e que roçavam assuntos bem opostos - ou o novo não-filme "Branca de Neve" ou o concurso "Big Brother".
Com o começar da peça, silêncio se fez, mas de imediato se quebrou com a música e com a voz do actor. O som estava muito alto e feria-me os ouvidos. Só desejava que a música acabasse rapidamente. Depois deste momento forte, Diogo Infante veste a pele de vários personagens tipo da sociedade moderna.
Os riso do público, ou deverei talvez escrever, pública, foram constantes, quer fosse devido ao texto, quer fosse devido às expressões faciais e corporais do actor. Alguns personagens são bem fieis à realidade.
Pensei até na minha figura de condutor ríspido e ordinário como possível personagem a figurar nesta peça.
Outros personagens tornam-se, após alguns minutos, numa "seca". Para usar uma expressão apropriada. As suas semelhanças com outros fá-los parecer não mais um, mas sim uma extensão de outro personagem.
Os risos, esses sim, vão-me saindo, ainda que discretos. Mas nunca como os do senhor, na cadeira ao meu lado, que, enquanto ria desinibidamente, batia com a mão na sua perna ... ainda mais desinibidamente. Não fosse o Diogo Infante dizer uma piada mesmo boa, despi i meu casaco e pousei-o em cima das minhas pernas. Como prevenção!
Para terminar, acrescento que, neste espectáculo, as pessoas vêm ver o actor.
Com grande discrição, mas sem perder qualidade, o desenho de luz, a cenografia e os outros elementos cénicos não perturbam nem ofuscam a performance do actor.
Regressei, sereno como o trânsito, desta vez. David Sobral"

http://www.tnsj.pt/2001/2000/programa/sexdrogas/index.htm








03 março 2013

Saudade dos sons

E quando as saudades sufocam ...
Procuro, nem eu sei o quê!
Palavras vãs ... estas
As minhas
Já vazias de qualquer sentido.

Ficam as tuas
Palavras ... só
A tua força
E o sentido de humor
Sempre
Tinhas 19 anos
E o mundo ali, ao alcance da tua mão estendida


"Olá, mais uma vez, temos um repetente no Jazz. Chama-se John Coltrane. Este senhor foi um excelente músico e nunca será esquecido.
Tanto no mundo do Jazz como fora dele, existem músicos de todas as idades e estilos que gostam do seu estilo.
Coltrane tinha uma grande devoção por Deus e dedicou muitos discos à sua fé.
Não é algo que me emocione pois cada um tem as fés que tem e as devoções que quiser. Não ter qualquer uma é que não me parece saudável!
Acho importante acreditarmos e termos fé, pelo menos, em nós próprios, no caso de não crermos em mais nada. Alimenta o ego!
Bom, isto já está a ficar parecido com a missa de domingo!
Vamos é ouvir a música de Coltrane.
Até amanhã e já sabem que ... Jazz Faz Tarde."

David Sobral