13 dezembro 2012

Outras saudades ...


E, agora, mamã?
Tinha mais um cachecol para terminar, sentada à sua beira ...
Amanhã, no hospital
Vigiaria o seu respirar
Chegar-me-ia a si para ouvir a sua voz baixa
Mas a sua voz
Perguntar-me-ia pela Alice pequenina e pelo querido Miguel
Eu havia de mostrar os filmes que fazia
Onde o Miguel, a dizer-lhe 
"Olá, Alice ... depois vou-te visitar!
E a repenicar dois beijos
Para si
Do outro lado do écran
Onde a mamã estava, mesmo assim ...
E donde retribuía o beijo, enquanto estendia a mão
Para lhes afagar a face.
Como se eles estivessem ali
Ao alcance dos seus dedos estendidos.
Mas ainda a sua mão estendida ...
Com um sorriso cansado
Mas o seu sorriso ...
E eu repetiria as histórias do Miguel
Do "querido Miguel"
Como a mamã dizia.
E depois, um "até amanhã, mamã!"
E a certeza ou a esperança da certeza de que regressaria a casa da Nini.
E o papá à sua espera
Para retomar os dias ...

E agora, mamã?
Partiu há bocadinho e eu tenho, já, tantas saudades do seu olhar e da outra parte do David que levou consigo.

E agora, mamã?











16 novembro 2012

Antes como agora


O tempo regressa, infalível.
Irreverente e obstinado.
Como o frio.
O tempo sempre.

Permanente na tua ausência tão presente!
Impõe a saudade que vem do passado
Percorridos que foram longos caminhos oblíquos.
Refugia-se num aperto de garganta
Emudecida por brumas de angústia do futuro.
Desencontro de tempos.


Tranco-o no pensamento.
Aprisiono-o num punho fechado para que não fuja.
Em direção às saudades que já tenho do futuro
Que seria.

Que fazer com o tempo?
Ou com os intervalos de tempo?
...
Aconchegar-me na eternidade de um olhar sereno
E antes, como agora.
Cavalgar o tempo.








14 novembro 2012

Humano ou fera?


E não sei como manter a fé no género humano!

Hoje, IPO-Porto, da cama do lado
incapaz (por falta de força) de carregar na campainha, a dona M. C.
toda ela dor
toda ela tristeza nos olhos fundos
toda ela palidez
toda ela saudades do filho
(que sempre vem)
toda ela tempo de espera pelo alívio da dor, na próxima injeção ... gemeu..
"Está com dores, dona M.C.?"
Sorriu-me do fundo dos olhos negros.
Que sim.
Toquei.
Uma bata verde, à entrada da enfermaria.
"Que se passa?"
"Por favor, diga à enfermeira que a dona M. C. está com dores. Pediram de avisasse mal a dor desse sinal!"
"Vou avisar."
E desligou-se o piscar vermelho do pedir ajuda.
Lá fora, no corredor, o som das vozes.
"Enfermeira, a senhora da cama 20 está com dores!"

Um voz sem rosto.
"Outra vez??"

Mesmo assim, a dona M. C. sorriu-me!

E apetece-me recordar Inês de Castro, quando se apresenta perante o rei, avô dos seus filhos ...

"Põe-me onde se use toda a feridade,
Entre liões e tigres, e verei
Se neles achar posso a piedade
Que entre peitos humanos não achei.










07 novembro 2012

Falar por falar ...


Tenho destas noites.
O coração dissolve-se
Os olhos vagueiam pela páginas do livro que me acompanha.
"A ponte sobre o rio Drina"
Hoje o olhar, qual vagabundo,
Perde-se por entre frases e pontes e vidas e rios que não desaguam.
Perde-se nos intervalos brancos
Deixados pelas personagens que entram ou saem
Eu não me fixo nelas
Já vou à frente...
Mais à frente
Lá mais longe
Onde não me vejam pensar
Onde não reparem naquela palavra certeira que me faz sobrer
Que me faz tremer
Que me pressiona a ler ...
E eu fujo de pensar.
Pensar é doloroso.
Ainda mais quando se repousa a cabeça entre os dois braços.
Para pensar, melhor e mais claramente, seguramente.
Mas eu não quero pensar ...
Não dessa maneira
Os olhos inundam-se
O ar ausenta-se, a respiração pesada.

Quero regressar atrás. 
Ao ponto de partida ...
Saberei qual foi?
Só regressar
Qual sombra por sob o sol.





29 outubro 2012

Obrigada, querida Branca





Hoje, ofereceram-me um ramo de ternura.
As ondas levaram-te o cravo vermelho que a Branca deixou, para ti, no areal de Moledo.
A Branca nunca te encontrou.
Aqui.
A Branca nunca te conheceu.
Aqui.
No entanto, encontrou-te ...
No entanto, conhece-te ...
Através de mim.

"Mamã, vamos dançar?"

Aprendeu a apreciar a tua natureza doce e corajosa.
Que permanece nos corações que cativas ...
E vive no dorso das ondas.





16 outubro 2012

Coração partido ... coração partiu ...

O Porto, a tua cidade
Os palcos vazios ...
Porque lá não vou

O silêncio das ruas
Que percorro inertees
Porque não as vejo pelos teus olhos
De luz

O silêncio da casa, pela manhã
Porque a tua música se apagou
E os sons que escolho não falam de ti

E são pilhas e pilhas de sons
Quietos nas prateleiras
Que não ouço
Porque soam à ausência
Cada vez mais lenta
Mais pesada
Irreversível
Certa

E são poemas, são papéis
São registos de palco
Desenhos de luz
De acertos finais
Quem entra quem sai
Quem se coloca debaixo daquele foco
É a tua letra
As tuas agendas de mil projectos
Roupas ... o teu cheiro
Um cinto
A tua carteira
Um clarinete adormecido
A primeira guitarra
Em que não toco
Sem que o coração se sinta
Novamente perdido.
Partido.

Porque não me convenço!
Pior
Quando me dizem
- Tens de deixar o David morrer!
Não respondo
Mas as lágrimas gritam
- Não posso. Não sei como. Não quero. É cedo. 
Algum dia será? Porquê? Tenho de me envergonhar da dor? Não posso gritar a saudade?  
Sinto-me mais só sem as palavras com que falo de ti. 
Não temam ... os que me querem bem. Sou duas ... cada qual com seu desígnio ... ! 
O coração é grande, não pára de bater por ninguém.

............

Despediste-te, numa noite, hoje
Numa hora, esta
Na tua maneira doce
Invulgar
Braços e mãos estendidos para mim
"Mamã, vamos dançar?"

A noite logo te levou
O sono cedo te embalou
"Sim, meu filho vamos dançar."
Ter-me-ás ouvido?








11 outubro 2012


outubro
2012,
 os mesmos dias,
o amanhecer para a angústia e para o medo e o anoitecer para o medo e para o nada,
sobrepõe-se ao outro, 
outubro
2007.
Senti-o, antes de o confirmar.
Estranhei-o porque ainda não acontecera tudo acontecer ou ter acontecido naquele dia do mês - 5 ...6...7...8... 10 ... 11... - coincidindo com o mesmo dia da semana - ... a sexta ... o sábado ... a despedida do mar ... a febre de uma lágrima ... o esperar ...
O mesmo areal de Moledo.
Só a chuva substituindo o sol.
Ou nem isso.
Nem tu.

E não, não se sente da mesma forma!
As horas são mais lentas.
Os sonhos acordam-me porque - na próxima semana ...
A dor aperta mais.
O suor invade os poros.
O equilíbrio torna-se instável, como prédio implodido que deixa uma clareira
O olhar perde-se em busca de algo que diga que não.
Que não vai ser assim, da mesma forma.
Outra vez.
Não o mesmo partir e desligar silencioso...

Mas se já foi.
Se já te foste, David!
Como continuar à procura do -  talvez não?
E resistir sempre, ...

E não incomodar!







07 outubro 2012

Sons que regressam ... e dias que se repetem, passo a passo, dia a dia ...

Os sons do David! 
O circo! 
A luz!
Ou palcos que iluminou!
As palavras das canções!
"É preciso ouvir o que dizem as canções ..."
O jazz!
Com swing!

.....
E eu?
Que faço da saudade?






26 setembro 2012

Por outras palavras ... de outros ...










TU ESTÁS AQUI


Estás aqui comigo à sombra do sol
escrevo e oiço certos ruídos domésticos
e a luz chega-me humildemente pela janela
e dói-me um braço e sei que sou o pior aspecto do que sou
Estás aqui comigo e sou sumamente quotidiano
e tudo o que faço ou sinto como que me veste de um pijama
que uso para ser também isto este bicho
de hábitos manias segredos defeitos quase todos desfeitos
quando depois lá fora na vida profissional ou social só sou um nome e sabem
o que sei o
que faço ou então sou eu que julgo que o sabem
e sou amável selecciono cuidadosamente os gestos e escolho as palavras
e sei que afinal posso ser isso talvez porque aqui sentado dentro de casa sou
outra coisa
esta coisa que escreve e tem uma nódoa na camisa e só tem de exterior
a manifestação desta dor neste braço que afecta tudo o que faço
bem entendido o que faço com este braço
Estás aqui comigo e à volta são as paredes
e posso passar de sala para sala a pensar noutra coisa
e dizer aqui é a sala de estar aqui é o quarto aqui é a casa de banho
e no fundo escolher cada uma das divisões segundo o que tenho a fazer
Estás aqui comigo e sei que só sou este corpo castigado
passado nas pernas de sala em sala. Sou só estas salas estas paredes
esta profunda vergonha de o ser e não ser apenas a outra coisa
essa coisa que sou na estrada onde não estou à sombra do sol
Estás aqui e sinto-me absolutamente indefeso
diante dos dias. Que ninguém conheça este meu nome
este meu verdadeiro nome depois talvez encoberto noutro
nome embora no mesmo nome este nome
de terra de dor de paredes este nome doméstico
Afinal fui isto nada mais do que isto
...



Ruy Belo

10 setembro 2012

Rir para não chorar

"Perdemos os sonhos ou são os sonhos que nos perdem?"

Há muito tempo (ou nem tanto!), seria impossível eu perder os sonhos. Deixar de sonhar, não! Inimaginável, diriam os que melhor me conheciam.
"Lá estás tu com as tuas utopias, Isabel! Talvez tenhas razão, mas é pura utopia!"
"Põe os pés na terra, deixa-te de sonhos!"

Mas eu sonhava e, por entre os sonhos, (que ninguém notava), era igual aos outros.
O mesmo trabalho, a mesma disponibilidade, o mesmo cansaço, o mesmo entusiasmo.
Ano, após ano.

Os filhos a crescerem, dentro e fora dos meus sonhos. 
E eu dentro dos sonhos deles, queria crer.
Os meninos filhos e a sua mãe.
Sem desvios no caminho.


Os alunos a chegarem, um brilhozinho nos olhos sorrateiros a espreitarem-me.
E eu a fingir que não via.
Mas a aconchegá-los, logo, nos meus sonhos. 
Na utopia que me guiava e que, com eles, partilhava.
E juntos caminhávamos, porque só assim conseguia o que buscava.
Vê-los partirem, embalados noutros sonhos, levando um pouco de mim.
Porque me dava, sem nada perder.
Nunca se perde quando nos damos e lhes mostramos a alma.
Regressem, eles, um dia ou não.
Fizeram parte do meu sonho!
Os meus alunos, meninos.

"Perdemos os sonhos ou são os sonhos que nos perdem?"
Não sei.
Ando perdida, eu!
De mim e do sonho dentro do qual me sonhava!
Os caminhos por onde os sonhos andam; não os voltei a percorrer.
Encontro, às vezes, os meus meninos alunos e, por breves instantes, cruzo-me com a outra que eu era.
Até repito os gestos e o bater do coração, perante aqueles brilhozinhos nos olhos que cresceram e me abraçam e me dizem que nunca me vão esquecer.

Mas depois ...
Houve um setembro em que não regressei à escola, não recebi mais alunos meninos, nem os espreitei com o meu sonho.
Passei-lhes ao lado, cansada e com medo dos sonhos que lhes via na curiosidade do olhar. 
O coração fechara-se!
Abrir-lhes o caminho da utopia? 
Passara a ser uma utopia! 

Houve um 10 de setembro, numa abrasadora cidade de nome Barcelona, em que um dos meus filhos meninos deixou escorrer uma lágrima.
De pesado súbito desalento.
Foi um instante de lágrima!
Envolto num ténue sorriso ...

Nessa lágrima, afogou-se a força com que se consegue sonhar.








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03 agosto 2012

a incerteza dos dias

porque faço o que faço
porque não faço o que devia fazer
porque faço o que não devia fazer
revolteio
rarefaço-me
e refaço-me
acerto e desacerto
tropeço
levanto-me
sempre me levanto
porque sim
por que, não?
então, que faço?
ao longe, os foguetes da festa
distantes, os sons do baile da aldeia
uma lua cheia em pleno céu limpo de agosto
os grilos no escuro frio
sabem sempre a despedida
num outro agosto
lá longe
tão distante
outra lua, sob um céu escaldante de esperança
junto ao mar
o mesmo mar
um outro mar?
sempre o mar por perto
a vida a fugir-nos das mãos
a tua vida, David
e tu tão forte, David
tão seguro de que irias renascer
e eu contigo

e tudo valia a pena!
e eu contigo, de costas viradas para as certezas de outros olhares
incertos

só o teu olhar me guiava
e eu segui segura e certa de que fazia tudo o que devia fazer
 uma última certeza
que me segura 
quando caio 







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19 julho 2012

Memórias que ficaram ... de julho.


Agenda II
Já no dia 27 nos Jardins do Palácio de Cristal, é favor não perder Maria João no “Porto Blue Jazz”, entrada gratuita!


Esta, a de julho, 18 ou 27, sou eu.
Ovelha negra, perdida entre as outras.
Mais brancas, mais mansas e sem memória.
Definitivamente!

Não me interessa o que possam dizer de mim, do tanto tempo que acham que passou.
(Mas não). 
Tempo de mãe sem filho não passa por cima da dor. 
Afaga-o nas fotos, afoga-o nas lágrimas e afunda-o, dentro do peito ... para logo o sentir a esguer-se, um gigante, vindo de dentro.
Será sempre assim!
E cada vez pior, sussurra-me a Nicole.
A dor não abranda, tem aumentado; vai aumentar, diz-me o Horácio
A Ana, a Eduarda, a Margarida, a outra Margarida, a Isabel, outra Isabel ... todas já percebemos que é assim.
Remar contra a dor cansa!
Tanto faz.

Dos outros, alguns calam; não entendem. 
Acham absurda esta dor que permanece. 
Mesmo silenciosa.
O, por vezes, sentir-me fora do baralho; uma peça suplente de xadrez.
Inexistente!
Esta forma de estar de lado, neste lado da vida. 
Pêndulo entre cá e lá. 

Mas sempre inteira, onde quer que esteja. 
Serena, perante a doçura dos que me querem bem ou do brilho dos olhos dos meus netos.
Ácida, perante a raiva que permanece pela forma com que, alguns (poucos), te trataram. 
Que mal fizeste ... para além de sorrires, como quem pede desculpa pelo cansaço, mesmo nos dias mais difíceis? 
Porque os houve ... mas não viram. 
Ou não quiseram ver.
Para longe, para morreres mais depressa? 
Deixei o coração bater, os ouvidos ensurdecer; a boca fechar-se.
A pele gélida a transpirar.
Virei costas. 
Não voltei a olhar para trás.

Tanto faz. 
Esta sou eu, sem o brilho dos teus olhos, nos meus.
Viva com brilhos de outros olhos.
Dois pares de olhos cristalinos.
Eu.
Em reconstrução, uma outra, lenta, lentamente.
Sabendo ...
Sabendo sempre que a amargura e a saudade me vão adormecer, todos os dias.








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11 julho 2012

O retrato das datas

11 julho 2007

Paris.
Em busca de luz que nos ilumine o caminho.
Em busca de saber que há um caminho.
Que a estrada não pára ali.
Em busca de uma razão para sorrirmos.
Ainda ...
E tu sorris.
Que mais importa?


11 julho 2012

Não há como não regressar a Paris
Ao renovar da esperança
Apesar da imensa teia a tecer-se de conflitos
Silenciosos, silenciados
Em que nos vimos, tão subitamente
(Tu, amargamente)
Enredados.
E
Onde fiquei aprisionada
Onde fiquei só
Até hoje.
Aqui.
Única testemunha da tua dor calada.


A minha amargura continua por dizer.

Não aprendi, ainda, como não regressar.
A Paris.
Ao silêncio manso com que me ouvias.
Ao teu sorriso generoso e protetor.
A tanta dor.









............




14 junho 2012

Dia a dia



Mais um dia.
E como em todos os outros dias penso - mais um dia.
É assim que conto o tempo.
Até a noite adormecer.
É assim que, em cada dia, recomeço - mais um dia.

Sem ti, os dias são uma sucessão de retornos e regressos.
Mesmo sem ti, converso longamente contigo.
Comigo.
Na parte que ficou de ti.
E que sabe as respostas exactas que darias
Às perguntas que faço
A ti (ou a mim).
Porque só passou um dia.

Sem ti.
Cada dia.
É apenas mais um dia.




05 junho 2012

Silenciar a saudade



Uma árvore como se fosse a vida.
De alguém.
Que se expõe, despida de alento.
Uma árvore como se fosse navio naufragado.
Abandonado.
Uma árvore como se procurasse abrigo.
Uma árvore como quem se recolhe.
Ou se encolhe.
Uma árvore como quem resiste.
Amarrada por cordas tecidas de raízes.
Uma árvore como quem persegue um sonho.
Já dos outros.
Uma árvore como quem se debruça e se alonga em busca de alguém que passou.
E não ficando ... 
Para sempre.
A dobrou.









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31 maio 2012

Sair de cena.

Como dizer, senão dizendo, que hoje podia despedir-me dos dias.
Podia despedir-me do sol.
Do sabor a sal da água do mar.
Reter na memória sorrisos amigos para levar na viagem.
E os olhares que me acariciam.

Como dizer, senão dizendo, que hoje podia desfazer-me em nuvem.
Ser levada pelo vento, por entre os cumes verdes dos montes.
E poisar, docemente, na cauda de um cometa.
Que me levasse.
Ou escorregar, encosta abaixo, numa cascata.
 Que me lavasse.
As mágoas.

E não me devolvesse.

Como dizer, senão dizendo, que hoje pressenti o roçar das asas de "vampiros" antigos.
Que, sisudos e mudos senhores sem lei, ensombraram os teus últimos dias de sol.
As tuas ilusões sobre a bondade dos outros.
E o teu sorriso, David!
O teu sorriso!
De esperança.
E os meus últimos dias de ti.

Como dizer, senão dizendo, que, hoje, a metade de mim que resiste preferia tombar ...
Sair de cena, num aceno breve.
Apesar ...
A senti-los de novo, poderosos e sedentos, poisar nas calçadas.
E a sombra deles a crescer.
Sobre a minha sombra.

Hoje, poderia perder-me num atalho de outras sombras vagabundas.
Transparentes.
Porque tenho medo.
Porque sofri.
Por ti.
Porque sofro.
Por ti

Porque não há perdão.
Por ti.








24 maio 2012

O conjugar do tempo

Em dias consecutivos ... entre o passado e o presente ...
Alguns que me dizem - "Já chega de sofrer!".
Outro alguém que me sussurra - "Podes falar; falar sempre do David".
Um psiquiatra que me aconselha - "Tem de deixar o David morrer!".
Outro alguém que me explica - "É natural, passou tão pouco tempo! O que são 4 anos ... para a morte de um filho? Mas depois, vai serenar.".
Ainda - "Precisas de fazer o luto ... assim não dá! Os teus olhos têm de voltar a brilhar!"
E, num encontro fortuito, - "Já é masoquismo!"
Ou aqueles que acenam com o além - " Ele está muito melhor ... lá onde está. Isso devia sossegá-la."

Mas há sempre quem me diga "Sim, estou sempre aqui para te ouvir."

Quase nunca respondo; o que responderia se não me ouvem?
Se as frases estão feitas, à partida! Mesmo antes da chegada.
E o absurdo que ecoa, aqui por dentro, e remexe entranhas. Mantenho o silêncio da perplexidade.
Como? O sofrimento desta saudade tem limite temporal?
Pois se tudo fiz para não o deixar morrer! E ele morreu! Como deixá-lo morrer, novamente?
Apagar a vida como quem apaga o quadro?
Ou retocá-la com cal para que não se vislumbrem os traços do que foi sofrer e é, agora, o mesmo sofrer e saudade?
Como passou tão pouco tempo, se o sinto tão longo e distante?
Mas parece um quase agora.

E o luto? Como se faz? 
Resistindo para não vir aqui, sempre que penso em ti? Seria sempre.
 O luto! Não sei do que falam. 
Existe manual de instruções para fazer o luto?
É que eu luto, de lutar; como sempre lutei para não desvendar o que sentia; o que sinto.
 Numa luta permanente, que cansa e rói.

E, sim, eu sei que os meus olhos brilham, nos abraços do meu neto ou no segredar dele ao meu ouvido "Gosto muito de ti, bóbó".
Ou perante os olhitos negros da minha neta que começam a sorrir-me.
Ou o meu filho me faz uma festa tímida na cabeça.
Mesmo quando eu e o Manel recordamos as "coisas" do David, sentindo-as ao mesmo tempo, quando saltam da paisagem, quando um certo sabor da comida, quando um certo ritmo musical ou uma luminosidade mais intensa. 
Até um riso que sabemos que existiria, perante certas notícias ou novas de espetáculos.
Ou o mar!

Como ... masoquismo? Masoquismo seria esconder a profunda perturbação quando um amigo do David ... também parte! 
Como o Bernardo Sassetti partiu. 
E, ao partir, levou as recordações que o David lhe deixou.
Que não eram minhas e, mesmo assim, me deixam saudade. 
Masoquismo seria rejeitar uma ausência que se impõe, sempre presente.
 Masoquismo seria calcar a dor, sob uma pedra dura e cobri-la de musgo. 
A pedra continua lá; tal como o peso doloroso da perda.

Ainda bem que há sempre quem me ouça, quando a frase começa por "O David ..."

Porque a minha individualidade é esta dualidade; este não querer "a nossa antiga vida a fugir da mão ..."



12 maio 2012

Adeus, Bernardo Sassetti

David, tinhas razão. Este país não merece certas pessoas grandes. Nada nas televisões ... Agora que está a ser homenageado por dois dos três pianos. Longe e eu queria tanto poder ouvir e sentir-me lá junto deles. Tiveste sempre razão, David! Este é o país dos três Fs. - Fátima, Fado, Futebol. Sassetti não consta da lista!

27 abril 2012

Parabéns, David!

Foi há 34 anos! Num dia de sol.
Levantei-me cedo e ansiava pela hora de te conhecer.
Não sabia se era menino ou menina. Mas eu esperava um novo rapazinho.
E foi. Chamei-te David!
Foi um tempo de alegria.
Tinha 22 anos.
Havias tu, havia o Sérgio e eu.





Hoje, pesa-me a ânsia, um desejo indefinido de querer tudo, sabendo que não terei nada. Tarda a sensação de estar viva. E quero esconder-me.
Fui, há pouco, à janela da cozinha, donde tantas vezes te acenei um despedida ... passageira.
Voltavas sempre, depois de desligadas as luzes do palco.
...
Debrucei-me sobre os campos verdes, olhei-os, sem os ver.
Senti-me o pano húmido, ao meu lado, um daqueles panos de limpeza que se deixam à janela, para secarem, ao sol.
E que, ali, ficam um pouco enrodilhados, tantas vezes esquecidos.



Se espreitares por detrás da lua, verás o areal de Moledo cheio de cravos, enviados pela Nini.


25 abril 2012

Miguel Portas

O Miguel Portas deixou de estar.
O Miguel Portas continuará a ser ... um exemplo de humanidade e persistência na luta pelos ideais de liberdade, igualdade e solidariedade.
O Miguel Portas continuará a ser um sorriso acolhedor, um olhar cristalino e doce.

Hoje, trago a tristeza na alma e sinto-me mais pobre.



24 abril 2012

Existir sem ser.


Ontem a minha mãe fez, hoje, 84 anos. 
Apesar da idade, apesar das dores contínuas que a atormentam, 
apesar da recente cirurgia ... apesar da perda de um neto ... 
estava bonita. 
Estoicamente agradecida à vida que lhe trouxe, recentemente, uma bisneta 
a quem puseram o nome dela - 
Alice.
Que veio juntar-se ao meigo Miguel
Parabéns, mamã! Parabéns por ser como é!

Já eu ...
Até quando resistirei, sendo quem não sou?
Existir não é ser.
Eu existo.
Faço de acrobata para voltar a ser alguém; alguém de bem consigo própria, 
aquele alguém parecido com aquela que o David admirava, 
aquela de quem o David dizia aos amigos ser alma gémea?
Era eu?
Apenas mãe.
Se calhar somos apenas o que vemos reflectido nos olhos de quem nos quer muito bem.
E nos quer dizer que nos quer bem.
As palavras são palavras.
O que valem?
Uma desculpa pelo que não se exprime pelo olhar.
É nesse olhar límpido e raro, porque intencional, que nos sentimos ser.
Alguém.
Parabéns, mamã, por sentir e ser como é.

Já eu...
Podia até ser cegonha, no cimo da torre da minha aldeia, ao anoitecer.
Podia ser aquela alga, já escurecida, de que as ondas se esqueceram, na areia.
Até talvez um parapeito de janela vazio.
Ou uma estrela cadente de Agosto que se despenha lá longe, no monte.
Creio até que podia ser uma esquina de duas ruas sem nome.
Podia ser o escuro dos olhos brilhantes do meu neto.
Nenúfar vizinho das rãs que saltitam, de folha em folha.
Ou só um batente, em forma de mão fechada, silencioso na porta trancada.
Podia ser só silêncio.

Parabéns, mamã, por saber quem é e como é.
Parabéns, mamã, por ser.
Não, apenas, por existir.

Já eu ...
Ando perdida, a seguir as setas que indicam o caminho.
Não me desviar do percurso que sei a percorrer.
Longo, longo.
Duro, duro.
À espera ...
Em moto contínuo ...


Já eu ...
Só existo!

E tu, David, porque não podes regressar, 
só por um bocadinho?
Para me serenares ...
e eu te falar disto?
















17 abril 2012

Prisioneira do lado de cá!

A vida pára!
O tempo flui continuamente!
Uma flecha.
Apesar de toda a paciência do mundo, perante o arrastar lento dos dias que me pesam.
Que sei que vão sempre curvar-me. Apesar de erguer a cabeça, consciente da tua ausência, ao acordar.
Apesar de nos termos virado de costas para o futuro ... para que não o víssemos chegar!
Porque nos foi predito.
Apesar de ti. Da tua coragem. Do teu saber do meu sofrer.
Apesar de mim. Do meu serrar de dentes, de me esconder.
A vida e o tempo acorrentaram-nos em cárceres separados ...



03 abril 2012

Em Abril ... o David

Está tudo claro, no meu vazio escuro. Sei de cor a dor que terei de esconder pelo resto dos meus dias.
Resguardo-me no silêncio e até nas palavras mais ou menos automáticas com que aprendi a reagir à forma, às vezes, agreste, com que me falam.
Devem achar-me uma fortaleza! Que não sou ... mas iludo, tentando um sorriso polido. Recuando alguns passos para dentro de mim, para uma nesga de espaço vazio, onde me reconstruo.
Domino a arte do fingimento; da simulação que se aprendem à custa de nem eu sei bem o quê.
Porque a minha dor, se a exprimisse, como dói ... causaria dor ... a quem não quero.
Por isso, calo ou falo, adiando para depois a saudade que me escorre no sangue.

Mas, por vezes, tudo é demasiado, insustentável.
Regresso, aqui.
Regressarei sempre.
Deixar escoar a mágoa que vou guardando, em segredo.
Desfaço, então, a lisura da pele e desenho vincos por onde possam escorrer as lágrimas que aguardam pela solidão da noite.

E sossego, finalmente, no frente a frente, com a meiguice do olhar com que me olhas.
De uma fotografia.




24 fevereiro 2012

Passaram cinco anos?



  1. Quem poderia imaginar que o teu nome ficasse, para sempre, ligado ao Zeca!






    Câmara Municipal de Estarreja

    www.cm-estarreja.pt/newstext.php?id=4261
    Grupo de percussão Steel Drumming e Miguel Guedes tocam Zeca Afonso. Concerto... Produção e Gestão Executiva - Joana Ventura e David Sobral Técnico ...


    ... NSEIS: "Steel Drumming toca José Afonso"

    nseis.blogspot.com/2008/01/drumming-grupo-de-percussosteel.html
    16 jan. 2008 – "Steel Drumming toca José Afonso". fotografia Susana Neves design luzDavid Sobral. Steel Drumming toca José Afonso Drumming Grupo de ...



. : Município de Alcobaça : .

www.cm-alcobaca.pt/index.php?ID=4081
16 ago. 2006 – STEEL DRUMMING TOCA ZECA AFONSO. com participação ...Produção e Gestão Executiva > David Sobral | Joana Ventura Técnicos de ...

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VIVER A RUA

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David Sobral representa a determinação que eleva o homem e o agiganta, perante uma ... 'Steel Drumming plays Zeca Afonso', even though he was at an ...

Tributo a Zeca Afonso com percussão de bidões de aço no Teatro

barlavento.algarvedigital.pt/index.php/noticia?id=14395&tnid=5
27 abr. 2007 – Tributo a Zeca Afonso com percussão de bidões de aço no Teatro ...está a cargo de José Prata e a luz e direcção técnica é de David Sobral.