19 julho 2011

Outra vez!

As noites são um inferno.
A noite convida ao sono.
E quando o sono não vem?
E abro lentamente a porta do quarto.
E desço as escadas, devagarinho, pé ante pé.
Para não acordar o silêncio quieto da casa.
E inspiro o ar da noite, na janela da cozinha.
E procuro a claridade da aurora.
Que não tarda.
Há estrelas que me conhecem bem, de tanto me verem.
Silhueta recortada na claridade da cozinha iluminada.
A horas estranhas.
Horas em que a casa dorme.
E respira imperceptivelmente.
Na noite parada, sobre as luzes dos candeeiros.

Eu não; eu tenho um caminho a percorrer.
O mesmo caminho de ontem.
Talvez ...
Com certeza, o caminho da amanhã.
A noite, cada noite, de forma mais ou menos impaciente, sob os meus olhos fechados, abre as cortinas e desvenda o palco que se esconde da luz do dia.
Em cena, os mesmos actores.
Em cena, a mesma paixão desesperada por assistir a um novo dia.
Em cena, as mãos que não querem separar-se de outras mãos.
Em cena, uns olhos que procuram um olhar sob as pálpebras cerradas.
Em cena, eu.
Em cena, o meu filho.
Em cena, a repetição da vida em risco.
A repetição de um respirar cada vez mais brando, cada vez mais breve, cada vez mais sopro.

E recordo mensagens insinuadas em letras de músicas.
Adormeço, exausta, num sono profundo, pesado e curto.
"Que bom aspecto tu tens, Isabel!"
Ainda bem.


          

Agora que voltou tudo ao normal                               
Talvez você consiga ser menos rei
 E um pouco mais real
Esqueça
As horas nunca andam para trás
Todo dia é dia de aprender um pouco
Do muito que a vida traz.  
Mas muito pra mim é tão pouco
E pouco é um pouco demais
Viver tá me deixando louca
Não sei mais do que sou capaz
Gritando pra não ficar rouca
Em guerra lutando por paz
Muito pra mim é tão pouco
E pouco eu não quero mais
Chega!
Não me condene pelo seu penar
Pesos e medidas não servem
Pra ninguém poder nos comparar
Porque
Eu não pertenço ao mesmo lugar
Em que você se afunda tão raso
Não dá nem pra tentar te salvar

3 comentários:

Anónimo disse...

Bom dia. Era para dizer que já li, eu e a minha mulher o livro ao tempo mas só agora ganhei coragem em falar.
A minha mulher gostou de o ler, ela sim é que entendeu melhor o David, porque a ela fez, se lembrar os momentos dela no hospital.
Pela maldita doença...
Como a Isabel escreveu no livro, ter vindo ``conhecer`` melhor o David.
Só posso dizer que adorei ``conhecer`` melhor o David, dá para ver que ele era uma pessoa meiga, bondosa, carinhoso e amigo do amigo, mas só podia ser filho de quem é,só podia ter as boas qualidades da grande Mãe, e uma grande amiga que a Isabel é.
Um grande beijo deste seu amigo Paulo.
desculpe pelos erros:):)

Paulo Jorge

Anónimo disse...

Boa tarde!
O meu nome é Sónia, sou irmã de uma das enfermeiras do hospital de dia do HGSA, que cuidou do David e que me deu a conhecer o seu livro. Fiquei muito emocionada e comovida com a sua história e com o desenlace da vida do David, até porque teríamos a mesma idade. Deixo-lhe estas palavras de animo e coragem, pois fui mãe recentemente e nem quero imaginar a dor dilacerante que a Isabel sente todos os dias. Sou, a partir de agora seguidora do seu blog, e quero que saiba que penso bastante em si e que embora nao nos conheçamos lhe quero transmitir muita força!
Perdoe-me esta intromissão
Um Beijinho com muito carinho

Isabel Venâncio disse...

Olá, Sónia

Obrigada. As enfermeiras do Hospital de Dia foram espantosas e muito ternas com o meu filho. Acho que se afeiçoaram a ele e à forma risonha e bem humorada com ele se relacionava com elas.
Obrigada por ter querido conhecer o David através do meu livro. Acho sinceramente que ele foi um exemplo de coragem e paixão pela vida.
Eu recordo-o todos os dias e ainda não secaram as lágrimas das saudades.
Não vão secar.

Felicidades para o seu bebé.
Um beijo
Isabel