16 fevereiro 2011

Castelos de areia!


Metade de mim é o que grito mas a outra metade é silêncio.
                                                                           Ferreira Goular

Mais uma ida ao Hospital para nova consulta ... onde se marcou outra consulta para procurar uma terapia que melhore a minha qualidade de vida, no que diz respeito às dores articulares e musculares que sempre tive mas que se agudizaram desde a morte do David e depois da radioterapia.
É um médico fisiatra, simpático, bom ouvinte, muito delicado.
Conto a minha história, a tua ... esqueço-me de referir o problema que eu própria tive. É o médico quem mo recorda e realça os possíveis efeitos secundários dos tratamentos que fiz e faço. Esqueço-me, sempre. A minha "doença" é a minha saudade.
Parte das minhas dores, dizem-me, são provenientes do meu estado psíquico, versus tristeza. Sistema imunitário mais frágil; qualquer toque me provoca dores. Tenho de me compor, aconselham-me ... 
Vou tentar, prometo eu!
Trago os olhos molhados; choro sempre ao falar de ti.
E saio mas, à minha frente, está aquele edifício, elevo o olhar até àquele 4º andar, um piso da Medicina Interna ... um quarto nº24 ...
E a sombra regressa; espreita, por cima do meu ombro. Ambas sabemos que não há retorno; o tempo cristalizou-se, na penumbra daquele quarto. Mesmo assim, espreitamos ... Ficou o medo à flor da pele, um medo inusitado de que tudo volte a acontecer. Como se estivesses, ainda, à minha espera. Como se fosse possível o teu regresso a casa! Às luzes de um qualquer palco.
Já quis subir, percorrer aquele corredor até ao fim; é, lá ao fundo, o quarto nº24 ... espreitar! Mas desisti, por essa vez. O que poderia encontrar? O que procuraria, afinal?
O que procuro está em mim; é este amor (póstumo) que me queima. É a saudade com que me deito e a recordação da dor de perda, quando amanheço.
Com este medo estranho.
De tudo ...



Alegoria
Faço um castelo na areia do futuro. Torres
de névoa, ameias de fumo, pontes levadiças
de indecisão. Vejo a areia escoar-se
na ampulheta dos séculos; e um exército
de ondas rompe as linhas do infinito,
derrubando os muros de amanhã.
Nuno Júdice

2 comentários:

Jaime Latino Ferreira disse...

ALEGORIA II


Do meu castelo
derrubo
amuralhado futuro
das ameias
vejo tudo
vejo um lugar
sem ter fundo
e nesse fundo
descubro
que o meu lugar
é o mundo


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 16 de FRevereiro de 2011

Branca disse...

Tão lindo tudo o que escreveu Isabel, apesar de tão forte, às vezes há a beleza do amor na terrível certeza da dor.
E mais uma vez percebo tão bem, vou algumas vezes a esse quarto andar, também eu tenho de lá algumas recordações menos boas, que ficam no extremo do outro corredor, bem lá ao fundo.

Beijinhos
Branca