16 fevereiro 2009



À Manuela e ao Jaime queria agradecer ...
O sentir o David cada vez mais só dentro de mim - significa isso mesmo.
Não me é "permitido" forçar conversas sobre o David - em jantares de amigos, na escola, em família...
Só se os outros tomarem essa iniciativa.
Entende o meu psiquiatra que não devo impor o David; mesmo que esteja entre amigos ou família...
Diz ele que terei que guardar o David num cantinho, só meu.
E do Manel.
Que não devo ...
Por isso, me sinto só e o sinto cada vez mais só dentro de mim.
Mas não me referia aos amigos virtuais dos blogs.
A esses, acho que não imponho nada.
Ler-me-ão quando e se quiserem.
Partilharei com eles as minhas saudades, as minhas mágoas...que vão permanecer imutáveis (sei-o bem!).
Conhecerão o David, assim, através de mim.
Mesmo que não respondam...sei que existe alguém, desse lado, ao meu lado.
E sinto-me menos só, com o David que sinto cada vez mais só dentro de mim.
Não posso evitar senti-lo.
Não quero desobedecer.
Não quero impor a imagem da morte aos outros.
Não posso afastar os amigos.
Há o meu neto.
Preciso de obedecer e controlar a minha tendência natural para falar do David; porque tudo associo ao David.
Porque eu penso, constantemente, no David.
Mas não devo falar...
É difícil. Tão difícil.
Mas não me proibiram de falar de longe, de escrever de longe, de partilhar de longe...
Por isso, agradeço aos amigos virtuais que encontrei nesta Casa da Venância.
Com eles por perto, embora não presentes aqui e agora, sinto menos esta solidão de estar só com...
Sinto menos esta agonia na garganta; este nó que só se desprende depois de chorar um bocadinho e de falar um bocadinho mais ... do David.




Sou o fantasma de um rei

Que sem cessar percorre
As salas de um palácio abandonado...
Minha história não sei...
Longe em mim, fumo de eu pensá-la, morre
A ideia de que tive algum passado...

Eu não sei o que sou.
Não sei se sou o sonho
Que alguém do outro mundo esteja tendo...
Creio talvez que estou
Sendo um perfil casual de rei tristonho
Numa história que um deus está relendo...

Fernando Pessoa

15 comentários:

Branca disse...

"Mesmo que não respondam...sei que existe alguém, desse lado, ao meu lado." - É verdade Isabel, por isso aqui estou, mesmo quando não escrevo.
Beijos.
Branca

Anónimo disse...

ISABEL

Querida Amiga,

O Psiquiatra lá sabe, com todo o respeito ...

A imposição da morte é, de facto e nos dias que correm, muito incómoda, como se dela estivéssemos, quem quer que seja, ao abrigo!

Mas diz bem, aqui só a lê quem quer e só interage Consigo quem o entenda fazer.

Pese embora tudo o que diz e que eu respeito como respeito o que o psiquiatra Lhe diz a Si, ele lá sabe, a verdade é que não somos um cantinho ou uma multiplicidade deles, estanques e incomunicáceis entre si e que as coisas todas, afinal, se interpenetram umas nas outras prontas a influenciar ou a trair o nosso próprio olhar do momento e não nos podemos dividir assim, em cantinhos, ora presentes ou ausentes ao sabor das circunstâncias e a nosso ou dos outros belo prazer.

Claro que não podemos viver obcecados pela morte mas a morte de um filho como não poderá deixar de nos dilacerar ...!

Eu não sou psiquiatra e, por isso, não tenho que exercer qualquer tipo de terapia Consigo ou esconde esconde e percebo-A perfeitamente!

Também não tenho proridos, tenho-os cada vez menos (!), em falar daquilo que, é natural, os outros fogem e até por não se sentirem à vontade, desguarnecida que a sociedade vai ficando por evitar falar do que sendo incontornável e irresistível, no sentido em que a todos nos calhará em sorte se remete para um cantinho como o diz, já que, incomodando-nos a todos, se a minha Amiga não deve tomar a iniciativa em falar, os outros o fazem ainda menos e sem mal, vindo-se a Isabel a sentir remetida ou balcanizada neste Seu cantinho sentindo-se a Si e a Seu filho sós a cada vez mais, dentro de Si.

O que nos diz parece-me de uma linearidade e previsibilidade impressionantes!

E, depois, eu estou mesmo a imaginar:

A Isabel num social qualquer a falar com os outros sobre lugares comuns e a sentir, porém, o que não se consegue disfarçar, os olhares dos outros que Lhe contando uma anedota projectam sobre Si o compadecimento estampado de morte que involuntariamente Lhe projectam!

E como a Isabel não fala do assunto e os outros também não pese embora o seu sentir , o sentir da perda se vá avolumando, ironia das coisas (!), logo essa sensação de solidão vai em crescendo ...!

Conte comigo, connosco, para Lhe trazermos companhia e a Seu filho também!

Uma coisa é certa:

Que Deus a vai relendo, Deus e os deuses que somos todos nós, pode estar certa que sim!

Um beijinho, conte connosco

Jaime Latino Ferreira
Lisboa, 16 de Fevereiro de 2009

Anónimo disse...

Isabel, só passei, e escrevi, para saber que estamos aqui. Sempre. Frequentemente. Fale do David, escreva sobre o David, dê-nos o David a conhecer. Nós gostamos.
Um beijinho,
MM

Anónimo disse...

O David emana um sorriso bondoso e não creia que exista maior qualidade humana do que a da Bondade consequente."A morte de um filho é absolutamente inverosímel",disse um dia a Isabel.A morte é absolutamente inverosímel,embora pareça real...abraço amigo.António.

Anónimo disse...

Fiquei sem palavras...

Andei por aí o dia inteiro, procurei-as nas prateleiras entre os livros, mas só as encontrei impressas e muito gastas. Abri o frigorífico, talvez entre os iogurtes e as manteigas pois estão mais frescos, mas apenas encontrei os D e os L.

Saí para o jardim, que eu insisto em chamar quintal, e com a gata Tita atrás de mim caçando pássaros e roendo ervas, procurámos nos canteiros da salsa e dos coentros e nas folhas de hera. Não as encontrei.

O carteiro chegou e quem melhor do que ele para nos entregar palavras e até para as trocar quando se engana no destinatário! Mas os extratos de conta não são grande inspiração...

Como o nome indica, procurei-as no blog do Jaime, mas aí estava um silêncio cantado e rezado e voltei aqui.

Voltei aqui para encontrar o David e a Isabel e para lhes dizer que fiquei sem palavras, mas que isso não tem importância nenhuma, porque continuamos aqui como amigos de longa data e que me apeteceu dar-lhes um abraço e apagar-lhes as dúvidas, desfazer-lhes os medos, conversarmos sobre a vida e a morte e sobre gatos e sobrinhos e netos.

E dizer-lhes que não faz mal, porque às vezes os mais corajosos de nós são apenas gigantes egoístas com medo da Primavera!

Manuela Baptista
Estoril,16 de Fevereiro 2009

Anónimo disse...

Boa noite Isabel,
Através de si vou conhecendo melhor o David e percebo o orgulho em ter um filho assim.
Pena é que seja desta forma que o fico a conhecer.
Não percebo muito bem a teoria do seu psiquiatra, mas quem sou eu?
Desde Agosto que aqui vou vindo, a esta sua casa, acolhedora e triste... lembra-se das palavras que lhe dirigi?
Queria que não sofresse tanto, que não chorasse tanto... aos poucos fui compreendendo melhor o seu sentir, a sua luta em (sobre) viver após o David, sempre a sua mão agarrada à dele, sempre à espera de mais uma dança.

Fique bem Isabel

Filomena

Anónimo disse...

A PROPÓSITO DA ETIQUETA ANEXA

Tem ela o título:

"O sofrimento devia ser o instrutor dos sábios; porque mágoa é conhecimento..." disse Byron

Mágoa é conhecimento e instrutor dos sábios porque confrontados com ela deveremos saber geri-la despida de sentimentos negativos, todos os que nesse processo nos poderão assaltar e ainda que sem perdermos toda a força da indignação ainda que conformados também.

Sabedoria é isso mesmo!


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 17 de Fevereiro de 2009

Olga Almeida disse...

Não vejo as conversas da Isabel sobre o David como uma imposição, até porque não fala do negro da morte, mas da pessoa bonita que ele era. As pessoas gostam de ouvir e falar dele, todos gostavam muito dele, sentem a falta e sofrem a ausência daquele sorriso bonito. Mas, o médico lá saberá o que diz...
O David já não existe fisicamente, mas está presente em muitas coisas, na música, na luz, nos amigos... em todo lado deixou uma marca. Que adianta deixar de falar?! Se ele existe na cabeça de cada um...
Um beijinho grande
Olga

Ana Cristina disse...

Veio um corvo negro,negro
Veio um corvo a negrejar,
Dizer-me que a alegria
Vive para além do mar.
(...)
Porque foi ele que disse
Que a alegria por achar
Vive longe,muito longe,
Vive para além do mar.

Fernando Pessoa

Beijinhos.
Nini

Graça Lopes disse...

É verdade, Isabel, mesmo sem falar ou escrever, passo sempre por aqui para a conhecer e ao David.
Também gosto de aqui encontrar o Jaime que sempre gostei de ler no blog do Salvador.(Até já lhe sugeri a criação de um blog para nos deliciar com os seus poemas)
Um abraço e um beijo até ao Céu!
Graça

Anónimo disse...

PALAVRA É VIDA


De que adianta não falar das coisas que nos incomodam?

De que adianta ostracizá-las, metê-las num guetto?

De que adianta escamoteá-las, como se vivêssemos no melhor dos mundos?

Tenho para mim que nada disso adianta e que a palavra, aquela que, por exemplo, leva Isabel Venâncio a chorar a Sua perda neste seu blogue, antes pelo contrário, fazendo-A reviver tudo o que A liga a Seu filho David Lhe atenuam a perda e Lhe dão vida e mesmo que esta já não seja deste mundo!

Palavra é vida e sustentabiliza-a, aqui e agora, também!!!

Jaime Latino Ferreira
Estoril, 18 de Fevereiro de 2009

Anónimo disse...

GRAÇA LOPES

Minha Amiga,

Só para Lhe dizer que desde Janeiro que já tenho um blogue!

O endereço é:

http://www.a-musica-das-palavras.blogspot.com

Desculpe Isabel mas a interpelação de Graça Lopes tornou-se irresistível!

Beijinhos

Jaime Latino Ferreira
Estoril, 18 de Fevereiro de 2009

Ana Cristina disse...

( Para a Diana )

Menina

Nasceu bonita

Estrela brilhante

Uma fita

É o sabor que te fica

Cativante

Uma dica

Neste dia em que as velas

Brilham mais

São sentinelas

E te mostram de mansinho

Quais janelas

O caminho

-.-

Menina

Canto baixinho

Nos teus anos

Um beijinho


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 19 de Fevereiro de 2009

19 de Fevereiro de 2009 0:18


Davidocas,

Hoje à noite no jantar da Diana sei que estarás connosco.
É impossível esquecer-te porque tu a estrela mais cintilante e sempre presente na nossa vida.

Devias estar aqui.
As saudades são tantas.

1 beijinho no dia de anos da tua prima Diana ("D")...foi a tua mãe que "escolheu" o nome dela, sabias!

Jaime,

Obrigada pela poesia que dedicou à minha filha.

1 abraço.
Nini

Anónimo disse...

Boa tarde Isabel,
É a primeira vez que lhe deixo um post, embora tenha seguido o seu blog quase diariamente desde que uma vez o Jaime Latino Ferreira o mencionou no blog do Salvador. Perdi a minha Mãe fez em Janeiro 31anos, foi até hoje o maior desgosto da minha vida, ainda me faz muita falta. A minha Mãe como o seu David partiram cedo e deixaram-nos sem chão. Sofreram muito na sua doença mas sempre com uma grande atitude e alegria de viver. Depois da sua partida também eu acabei por me fechar só com ela, sempre que falava dela os meus amigos desviavam a conversa, pensando que me estavam a ajudar, éramos todos novos. No meu núcleo de amigos eu tinha sido a primeira a ter uma perda, ninguém sabia como lidar com ela. Dos amigos que restam dessa altura alguns hoje já entendem a necessidade que tinha de falar na minha Mãe.
Eles estão tão próximo de nós e é tão bom falar deles.
Um abraço
Ana

CA disse...

Querida Isabel,
Deixo-lhe um beijinho grande, grande, grande!
CA