31 janeiro 2009

Por cima do ombro



O não vir aqui não significa não pensar.
O pensar é constante. É como se tivéssemos passado a ser um - eu e tu, sempre, a espreitares por cima do meu ombro.
É como se tivesse passado a pensar por mim e por ti, sempre os dois pensamentos ligados.
Como explicar de outra forma?
...
Mas há uma certa lassidão que se apossou dos meus dias.
Nada me parece urgente neste tempo que me parece ausente, embora seja nele que estou presente.
.......
Aprende-se muito com a ausência.
Não qualquer ausência.
Mas com aquela tua ausência certa, definitiva, imobilizada, inerte num espaço que me ultrapassou no tempo e corre e corre, sem que o queira acompanhar.
É, de certa forma, uma conjugação de ausências; a do que foi e a aquela que vai ficar de um futuro que não será.
Fica-se de braços plenos de prantos.
E de palavras indizíveis.
E o passado silenciado é apenas sussurrado.
Talvez se encontre reflectido nos olhares.
Aí permanecerá, sem espanto.
Hermético.
Enquanto a minha eternidade de mãe durar.



NADA FICA DE NADA

Nada fica de nada. Nada somos.
Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos
Da irrespirável treva que nos pese

Da humilde terra imposta,

Cadáveres adiados que procriam.


Leis feitas, estátuas vistas, odes findas.
Tudo tem cova sua. Se nós, carnes
A que um íntimo sol dá sangue, temos

Poente, por que não elas?

Somos contos contando contos, nada.

(Odes de Ricardo Reis)

6 comentários:

paula machado disse...

Olá Isabel

como sempre entro leio e saio, mas não sei porquê hoje apetece-me lhe deixar um simples beijinho
Tudo o que li é real para mim

beijinhos do tamanho do Mundo

Anónimo disse...

SOMOS CONTOS


Se sou um conto que conta contos então eu conto.

Conto porque conto o conto que eu sou.

Porque, se sendo um conto, contos conto, ao meu eu acrescento os contos que me contaram.

Todos esses contos como uma fiada que se transporta no tempo, dos outros passa para o meu e a todos e ao meu conto conto e pelos séculos dos séculos, mais imaterial do que as estátuas e como as odes passam de boca em boca imemoriais.

Por cima do ombro, ao teu e aos outros contos transportamos acrescentando-lhes pontos ou não, fundindo-os uns nos outros e os contos permanecem, perpetuam-se e acabam por ter vida própria pela boca dos contos que os contaram numa espiral sem fim.

Do ventre materno, o conto transforma-se em pensamento e transformados todos em um só, ao ombro se transporta a História espreitando sempre para lá de cada esquina.

Eu conto um conto.


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 31 de Janeiro de 2009

Carecaloira disse...

Isabel,

passo por aqui todos os dias, não escrevo pois não sei o que dizer. Mas sinta que estou sempre consigo.

A mensagem que me deixou é linda, tocou o meu coração. Muito obrigada.

Beijinho grande
Marina

Anónimo disse...

Isabel,bom dia. Vou andando de blog em blog, e vejo que a que a Isabel vai deixando a sua presença, serena e apaziguadora!Que bom! Ela é importante para todos.
Um beijinho GRANDE,
MM

Ana Cristina disse...

(...)Não tenho pressa.Pressa de quê?
Não têm pressa o sol e a lua:estão certos.
Ter pressa é crer que a gente passa adiante das pernas,
Ou que,dando um pulo,salta por cima da sombra.
Não;não sei ter pressa.
Se estendo o braço,chego exactamente onde o meu braço chega.
Nem um centímetro mais longe.
Toco onde toco,não onde penso.
Só me posso sentar onde estou (...)

Fernando Pessoa
(Alberto Caeiro)
"Poemas Inconjuntos"

Se a pressa nos transportasse para outras dimensões!

1 beijo.
Nini

Anónimo disse...

Isabel, olá. Foi bom encontrá-la noutros locais da blogosfera.Hoje só venho dar-lhe um bjinho!
MM