28 setembro 2008

Outra carta


Outubro/07 Miradouro, Caminha


Sim, o tempo é como lava. Queima e arrasta...
Sim, eu sei que não existes.
Mas esta é a única forma que encontrei de me ir despedindo, nem que leve todo o meu tempo de existir.
Não é muito tempo, apenas o tempo de te recordar um pouco mais intensamente, aqui.
Escrever é a forma de me manter ligada, a ti.
Ainda que por palavras, somente.
Se fosse todo o tempo de pensar, estaria sempre aqui; nem podia ser de outro modo porque a dor é física. Sinto-o no buraco que se me abriu no peito.
Os pensamentos não se materializam; mas as palavras que aqui vejo são reais.
Por isso, escrevo.
Provavelmente, também quererias que me fosse desprendendo.
Mas é cedo.
Quero registar tudo! Se não, de que viverei?
Da memória que me pode atraiçoar?
Não consigo imaginar-me a viver sem este cantinho.
Preciso dele...
Olho para as fotografias e até elas parecem afastar-se já; como se não fizessem parte dum tempo longínquo ou tudo tivesse sido um sonho de que fui expulsa.
Sei que partiste...
Uns dias, consigo convencer-me de que é isto a vida e que não podia querer prender-te mais.
Começaria a ser doloroso.
Outros dias, toda essa teoria que construo, para meu próprio amparo, se desmorona e fico louca dentro deste silêncio onde me escondi.
Triste sina! Ter como consolo o menor dos males - partires como se adormecesses.
É Setembro, já no fim.
Em Outubro, faz-se escuro!


O Mar

Antes que o sonho (ou o terror) tecesse
Mitologias e cosmogonias
Antes que o tempo se cunhasse em dias
O mar, o sempre mar, já estava e era
Quem é o mar? Quem é aquele violento
E antigo ser que rói os pilares
Da terra e é um e muitos mares
E abismo e esplendor e acaso e vento?
Quem para ele olhar vê-o pela primeira vez
Sempre.
Com o assombro que as coisas
Elementares deixam, as belas
Tardes, a lua, o fogo de uma fogueira
Quem é o mar, quem sou?
Sabê-lo-ei no dia
Que se segue à agonia.

Jorge Luís Borges

1 comentário:

Anónimo disse...

Foi tudo tão rápido.
Terá sido um pesadelo?
Depois de noites mal dormidas, acordo no teu quarto e sinto dolorosamente que é real.

A minha vida era um rodopio que me estonteava e anestesiava:a Diana, o trabalho, os convites, os passeios, os amigos, o Alex, o Guincho, os fins de semana na Malveira ou em Janas, a tertúlia n'O Biscoito, o CCB ou o Chiado quando o convite chegava pela tardinha e tu sempre no meu coração com saudade mas com um sorriso.

Agora que tenho muito tempo vazio,silencioso,sem vertigens e de agenda ainda desocupada...agora que regressei e tu já não estás cá, está a ser impossível controlar as saudades e as lágrimas nos olhos.

Não te preocupes preciso de tempo para este regresso...

Brincavas com o Tony na casa "do páteo", no sofá da sala, a ver quem era o mais forte no jogo do "braço de ferro".
Tinhas talvez 5,6,7 anos ...não sei mas também não importa..., o Tony adorava meter-se contigo e a "luta" renhida continuava contigo agora em desvantagem.
Não desarmavas,nunca desistias.

Viraste-te para mim e disseste: "Nini, é agora, atira-me a lata dos espinafres!".
Era o tempo do "Popeye, the Sailorman".

1 beijo da Nini.