25 fevereiro 2008

As palavras


Como de costume, deitei-me, por volta da uma ou duas da manhã porque não tenho sono, mesmo tendo tomado uma pastilha milagrosa, ao jantar.
Como de costume, escrevo ao David e dedico-lhe um poema, escolhido, diariamente, conforme o meu estado de espírito.
Como de costume, depois de tomar mais duas pastilhas milagrosas para dormir, leio umas páginas dos livros que tenho na mesinha de cabeceira.
Como de costume, apago a luz, por volta das três da manhã, porque me parece que já vou dormir.
Como de costume, fecho os olhos, procuro a melhor posição para dormir e tento esvaziar a mente.
Como de costume, desisto de tentar não pensar nos pensamentos tristes que me assaltam.
Como de costume, por volta das quatro da manhã, levanto-me.
Como de costume, fumo um cigarro na varanda e vejo o Porto, ao fundo, iluminado e silencioso.
Como de costume, sento-me ao computador ou pego no meu diário e escrevo.
Como de costume, procuro palavras que me silenciem por dentro.
Como de costume, as palavras tardam em chegar...
Como de costume, são palavras que percorrem as mágoas e saudade dum tempo onde me encarcerei.
Como de costume, procuro palavras que me lancem na ilusão de um tempo - a ser um pouco mais feliz.

As palavras sempre me fugiram ou surgiram no momento errado.
As palavras sempre me assustaram e armadilharam o caminho.
Não as palavras banais! Mas as outras, as sentidas, expressivas e quentes como bronze macio, brancas de paz e de ternura, doces e vermelhas como morangos ou amoras silvestres.
Como só tu , David, sabias dizer... E eu ouvia... mas não tive tempo de aprender. Só contigo ia tacteando essa experiência de não ter medo de dizer porque me ensinaste que nunca há nada a perder, se forem sentidas e sinceras.
Estas palavras sempre me escapam ou eu não sou capaz de as libertar, no momento certo, do casulo onde hibernam.
O casulo vai secando e muito ficará por dizer.

Como de costume, passa das cinco da manhã.
Como de costume, vou tentar, novamente, adormecer.

Isabel

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