13 março 2006

Se a moda pega...

Se a moda pega...
Recordam-se daqueles números sobre as faltas dos professores que a Srª Ministra resolveu divulgar em plena greve?
Recordam-se de ter havido um "pedido de desculpas" por parte do mesmo sector, em virtude de os números divulgados não terem sido alvo de uma análise cuidada? E de pagarem os santos pelos pecadores?
Pois é.

Aproveitando o exemplo ministerial, aí temos alguns dos nossos colegas "mais ou menos" gestores a disparar de forma patética em todas as direcções/contra todos os colegas de escola como forma de exorcizar a raiva e a impotência que sentem por não conseguirem, de forma legal, controlar o excesso de faltas de certos e determinados professores.

Aparentemente, está na moda alguns "gestores" pegarem nos livros de ponto como quem pega num livro de contas do merceeiro e somarem as faltas. Assim...simplesmente somar. Nem a divisão ou subtracção dominam!
E o resultado da soma é, assim, imediatamente divulgado. Antes de qualquer procedimento analítico e estatístico mais rigoroso.
Se são mil e tal ... faltas/tempos de 45 min. desde Setembro, são-no para todos os professores da escola!
Tenham dó! Isso é um insulto a qualquer portador de uma inteligência média.

E querem os autores destas "análises" considerar-se exemplo de bons profissionais? Onde estão a honestidade intelectual e o rigor necessários para que os levem a sério? E dizem-se bons profissionais?
Demonstram apenas incompetência, ignorância e falta de respeito pelos muitos excelentes professores que há nas escolas e que raramente faltam. Ou faltando, o fazem por razões mais do que justificadas.

Misturam tudo no mesmo saco!
É, de facto, uma investigação de se lhe tirar o chapéu!!!
Desconhecem aqueles mapinhas de faltas que, mensalmente, se afixavam? Era capaz de ser uma atitude bem mais sensata e transparente.
E aproveitavam esse tempinho de sobra para trabalharem naquilo que interessa: a aula.
Porque é na sala de aula que se ganha a batalha contra o insucesso.

Enfim...
Quero deixar claro que concordo em absoluto com a ocupação integral do tempo lectivo dos alunos.
Não concordo com as tais "aulas de substituição". Mas há razoáveis alternativas se quisermos.

Não posso deixar de constatar que se falta muito. Certos e determinados professores faltam muito. Muitíssimo!

No entanto... somos todos bons na avaliação.
Na prática, gozamos todos o mesmo número de dias de férias.
Na conta bancária, onde nos é depositado o salário também não há diferenças.

Ao contrário do que pensam (se é que pensam!!!), os que divulgam, em bruto e sem momear, os números de faltas dos professores estão a cometer um erro crasso.
Provocam mal-estar, desgaste e revolta em todos os professores que, não faltando, se sentem incomodados por não haver transparência nesse processo.

Não havendo hipótese de fazer reflectir na avaliação o absentismo de certos e determinados professores, há sempre hipótese de se ser mais rigoroso noutros âmbitos da vida da escola.
Porque não o fazem? Porque não têm uma conversinha privada com quem merece? Por medo?
Assim não dá!!!

Acabam a dar razão a quem acha que a escola não merece qualquer tipo de autonomia.
Quando há oportunidade de inovar, a alguns só lhes dá para o disparate!

08 março 2006

Não sou feminista!

Mas há belíssimos poemas sobre a mulher.
E, como hoje é Dia da Mulher, aqui ficam 2 ou 3.

I
Gosto das mulheres que envelhecem,
com a pressa das suas rugas, os cabelos
caídos pelos ombros negros do vestido,
o olhar que se perde na tristeza
dos reposteiros. Essas mulheres sentam-se
nos cantos das salas, olham para fora,
para o átrio que não vejo, de onde estou,
embora adivinhe a a presença de
outras mulheres, sentadas em bancos
de madeira, folheando revistas
baratas. As mulheres que envelhecem
sentem que as olho, que admiro os seus gestos
lentos, que amo o trabalho subterrâneo
do tempo nos seus seios. Por isso esperam
que o dia corra nesta sala sem luz,
evitam sair para a rua, e dizem baixo,
por vezes, essa elegia que só os seus lábios
podem cantar.

Nuno Júdice

Outro de Ary dos Santos

Retrato de Sophia

Senhora dona águia água égua
inglesa num jardim de potros gregos
mordiscando beleza rega cega
do regador de inês em seus sossegos.
De muitos anos colhes magro fruito
que depressa transformas em compota
receita tão bem feita que de há muito
nos açucara o travo da chacota.
Porém quando por vezes és de pedra
não mármore mas árvore mas dura
do fundo do teu mar levanta-se a cratera
da nossa lusitana sepultura.

Por fim...


Poema à Mãe

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe.
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha – queres ouvir-me? –
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda ouço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio de um laranjal...
Mas – tu sabes – a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade